Chamada para artigos SOLETRAS n. 42 2021.2 -Prorrogada até 20 de maio

2020-04-21

Organizadoras:  Maria de Fátima Fernandes – Universidade Pública de Cabo Verde (UNICV); Norma Sueli Rosa Lima – Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Simone Caputo Gomes – Universidade de São Paulo (USP)

Dossiê:  Sentir-se/estar apartado, estabelecer elos: tendências insulares na literatura de Cabo Verde

Ancorada em conceitos como rizoma, trânsito e transárea, Simone Caputo Gomes assim define a literatura cabo-verdiana contemporânea: "uma literatura-mundo para uma pátria-mundo". Na trilha   do poema “Signo Identitário”, de Oswaldo Osório, entende Cabo Verde como uma ponte entre identidades: “Geográfica e sentimentalmente África e demograficamente e culturalmente mestiços não temos de ser europeus nem mais nem menos africanos./Temos, isso sim, é de saber conviver caboverdianamente neste vasto Atlântico que nos rodeia e a que desde cedo servimos de ponte de identidades” (OSÓRIO, 2007, p. 79). 

Como pensar, então, a Literatura de pertença cabo-verdiana face um mundo à deriva? E como se constrói essa pertença insular, arquipelágica, e ao mesmo tempo diaspórica, numa pátria erigida por elementos e fatores externos ao território desabitado encontrado em 1460 e colonizado por portugueses? “Uma pátria-entre-mundos parece-me afinar-se com a ideia de uma escrita-entre-mundos, uma literatura viajante, de contato, de trocas, de movimento e devir, híbrida e pós-colonial, que interroga paradigmas hegemônicos e transcende fronteiras e limites de ordem geográfica, genérica e temporal”,  argumenta Gomes.

Assim, uma história literária que, a princípio, mantém laços estreitos  com uma raiz de pertença insular, amplia a espacialização em vetorização, orientando-se para uma literatura “planetária” (SPIVAK, 2003, p. 72), desamarrada de uma raiz fundada no conceito de “nação” e presidida por uma concepção estrutural rizomática.

Nascida da necessidade de mapear o espaço, desde os relatos de viagens quinhentistas e seiscentistas,  já com vocação diaspórica e mesmo transnacional, a literatura cabo-verdiana vai ultrapassar a angústia do isolamento expressa em muitas obras, sobretudo algumas do marcante período de produção claridosa, para dialogar com a literatura mundial, superando a experiência traumática da seca prolongada das décadas de 1930 e 1940 e da fome consequente no sentido de estabelecer um convívio com o mundo e as vivências contemporâneas de desenraizamento e busca de interlocução.

Ottmar Ette (2017) compreende “a Literatura como espaço onde se exercita a convivência Humana”. Sobre o saber da convivência, afirma que as ilhas e os arquipélagos jamais serão vistos como figuras ancoradas em um lugar fixo, mas como entidades dinâmicas (ETTE, 2012, p. 87). Desta forma, apoiados por Ette, concebemos a estrutura significativa da ilha como dupla: por um lado, pode significar um estado fechado, isolado do Outro; por outro, a consciência de uma relacionalidade de múltiplas formas com o Outro” (ETTE, 2005, p. 136).

No contexto de pandemia em que dolorosamente nos inserimos na atualidade, com receio do contato físico, guardando distanciamento social, a Literatura pode ser uma porta aberta para refletirmos sobre as ilhas que nos isolam (isolas) e as que nos possibilitam o voo e o encontro, ou seja, os espaços simbólicos de reclusão, mas também os de contato que podem representar a humanidade em Cabo Verde como em qualquer outra parte do mundo.

Para o dossiê do número 42 da revista Soletras, convidamos pesquisadores a enviar artigos que reflitam sobre a perspectiva simbólica da ilha em: suas figurações de isolamento ou de relação com o outro, ponte entre identidades ou como pertença ou ruptura a limitações de espaço, que só podem ser viabilizados pela criação literária

 

Bibliografia:

ETTE, Ottmar. Von Inseln, Grenzen und Vektoren. Versuch über die fraktale Inselwelt der Karibik. In: BRAIG, Marianne/.ETTE, Ottmar/ INGENSCHAY Dieter/ MAIHOLD, Günther; (ed.): Grenzen der Macht – Macht der Grenzen. Lateinamerika im globalen Kontext. Frankfurt M.: Vervuert Verlag, 2005, p. 135-180.

ETTE, Ottmar. Worldwide: Archipels de la mondialisation . Madrid, Frankfurt am Aim: Iberoamericana Vervuert, 2012. Edição Kindle, online.

ETTE. Ottmar. Ciência da vida. Conferência em 3 partes. Rio de Janeiro: Casa de Leitura Dirce Côrtes Riedel, 4 de dezembro de 2017. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=3FV6dTKLV1U&index=3&list=PLZugpfRLjZ_qb9xNc8ApP35kT2vd-3Sn1>. Acesso em 18 de abril de 2020.

GOMES, Simone Caputo. Viagens da Literatura Cabo-verdiana entre raízes e rizomas, entre árvores e ondas: literatura mundo para uma pátria mundo. Conferência proferida no Festival Literatura-mundo do Sal, Cabo Verde, junho de 2018. Texto inédito, no prelo. In Via Atlântica n. 37,  Dossiê A Literatura-Mundial e o Sistema-Mundial Moderno.

OSÓRIO, Oswaldo. A sexagésima sétima curvatura. Praia: Dada Editora, 2007.

SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Death of a discipline. New York: Columbia University Press, 2003.

Prazo para a submissão de textos: 1 de novembro de 2020 a 30 de abril de 2021