“com amor”: o legado colonial da pornografia pedófila racializada no mundo atlântico

Autores

DOI:

https://doi.org/10.12957/childphilo.2024.81736

Palavras-chave:

infância, raça, estados unidos, inocência, pornografia, pedofilia

Resumo

Este trabalho analisa cartões postais norte-americanos do início do século XX, com foco na representação de crianças negras e brancas como uma ferramenta estética de supremacia branca e prazeres pedófilos racistas. Essas representações refletiam e perpetuavam ideologias coloniais e estereótipos raciais, influenciando as práticas e políticas educacionais e contribuindo para uma sociedade onde a discriminação e a sexualização de crianças eram normalizadas. O artigo começa com o contraste na representação de crianças brancas e negras, revelando um padrão no qual crianças brancas eram normalmente fetichizadas como personificações de inocência e pureza, enquanto crianças negras eram submetidas a retratos pornográficos que reforçavam estereótipos negativos e buscavam garantir a contínua subjugação intergeracional dos povos afro-americanos. Um aspecto significativo dessa análise é o papel do zeloso defensor da pureza Anthony Comstock na formação de visões sociais sobre a inocência e a obscenidade da infância durante a Era Progressista. Como inspetor postal dos EUA, Comstock exerceu uma influência sobre o discurso e as políticas públicas, principalmente em suas campanhas contra a distribuição do que considerava representações de moralmente questionáveis. Essa investigação abrange as implicações raciais das ações adultocêntricas de Comstock, explorando como contribuíram para o tratamento diferenciado de crianças negras e brancas, tanto nas representações de mídia quanto em contextos sociais mais amplos. Argumento que essas imagens não eram apenas reflexos passivos de crenças sociais; na verdade, eram ferramentas ativas usadas para influenciar os processos de educação e socialização das crianças, e contribuíram para a perpetuação da violência de Jim Crow, manifestada através de agressão sexual, castração e linchamento de jovens negros. Além disso, este artigo investiga o contexto sócio-histórico no qual as imagens racistas e pedófilas foram produzidas e divulgadas. Esses cartões-postais são traficados hoje em dia, sob a falsa designação de “Memorabilia Negra”, atingindo preços significativos como ítens vintage de colecionador; mas estou redefinindo-os como um gênero de pornografia infantil explícita. Essa perspectiva decolonial desafia criticamente as narrativas vigentes que podem higienizar ou minimizar a natureza exploratória e violenta dessas imagens. Este trabalho pede uma reconsideração do significado histórico desses itens de consumo como instrumentos cúmplices na manutenção de estruturas coloniais e ideologias acerca da inocência infantil na América do Norte. Dentro dessa estrutura, a desumanização de crianças negras por meio da pornografia pedófila reflete uma longa herança de violência contra crianças nas tradições ocidentais e a estratégia colonial de explorar crianças de cor como um mecanismo de lucro e prazer libidinal.

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Publicado

2024-07-31

Como Citar

PATTON, Stacey. “com amor”: o legado colonial da pornografia pedófila racializada no mundo atlântico. childhood & philosophy, Rio de Janeiro, v. 20, p. 01–37, 2024. DOI: 10.12957/childphilo.2024.81736. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/childhood/article/view/81736. Acesso em: 7 jul. 2025.

Edição

Seção

dossier: "confronting adultcentrism in educational philosophies and institutions"