A Relevância do Design de Prompts na Interação com Inteligência Artificial Generativa
Autoria: Ana-Paula Correia e Sean Hickey
Introdução
Com a crescente presença da inteligência artificial (IA) generativa no nosso cotidiano, uma nova área de conhecimento está emergindo: a habilidade de criar um prompt para IA, comumente chamada de engenharia de prompts (criação de instruções textuais para IA). Ao interagir com uma IA generativa, o “prompt” geralmente se refere a um trecho específico de texto ou instrução fornecido ao modelo de IA para que este gere uma resposta ou resultado. De forma simplificada, trata-se da pergunta ou solicitação inserida no modelo, que serve de input para a geração de uma resposta. O prompt oferece ao modelo tanto um ponto de partida quanto critérios orientadores para a elaboração da resposta (output).
Muito tem sido escrito e discutido sobre os resultados gerados por modelos de linguagem baseados em inteligência artificial, mas pouco se tem discutido sobre suas entradas textuais– os prompts. É importante refletirmos sobre o papel fundamental do prompt na valorização da ingenuidade e capacidade de improvisação assim como da criatividade humanas durante a interação com a IA generativa.
De acordo com o Google (2024), um prompt é composto por quatro elementos (Google Cloud, 2024):
- Tarefa: o que se deseja que o modelo faça ou responda, podendo assumir a forma de um conjunto de instruções ou uma pergunta.
- Instruções do sistema: os critérios e restrições para a resposta (output), como o número de palavras ou o estilo literário da resposta.
- Exemplos com amostras da resposta ideal (few-shot): exemplos de uma resposta ideal, que evidenciem aspectos como tom ou estilo.
- Informações contextuais: o conteúdo essencial necessário para que o modelo compreenda e responda adequadamente ao prompt. Essas informações podem incluir descrições do objetivo do conteúdo ou do público-alvo, bem como tabelas com dados e figuras-chave.
Outros aspectos importantes na criação de um prompt incluem:
- Clareza: Um dos princípios fundamentais do design de prompts é a clareza. É essencial evitar perguntas vagas ou excessivamente amplas. Para tornar o prompt mais claro, recomenda-se dividir a pergunta em partes menores e mais fáceis de gerir.
- Informações relevantes: Incluir todos os detalhes essenciais que possam influenciar a resposta à pergunta ou ao tema abordado.
- Linguagem: Evitar o uso de gírias, jargões ou termos técnicos excessivamente complexos que o modelo possa não compreender.
- Critérios de resposta: Caso haja instruções ou preferências específicas quanto à resposta do modelo – como número de palavras do texto ou nível de leitura – é importante incluí-las no prompt.
Design de Prompt versus Engenharia de Prompt
Ao examinar os componentes e considerações para a criação de prompts, propomos o conceito de design de prompt como um complemento à engenharia de prompt. Embora engenharia e design sejam áreas relacionadas, diferenciam-se no seu foco e abordagem. A engenharia envolve essencialmente a aplicação de princípios científicos e matemáticos para resolver problemas práticos e criar soluções inovadoras. Já o design baseia-se na aplicação da criatividade, em habilidades de resolução de problemas e em uma compreensão profunda do usuário, com o objetivo de desenvolver produtos, serviços e experiências que sejam ao mesmo tempo funcionais e esteticamente atraentes.
O design de prompt destaca a atividade intelectual, a criatividade e a expertise envolvidas na criação de um prompt capaz de engajar um modelo de linguagem de forma significativa, visando gerar uma resposta de alta qualidade, satisfatória e eficaz — proporcional ao esforço intelectual empregado na elaboração do prompt (input). Ao enfatizar a importância do design de prompt, buscamos incentivar uma abordagem mais refinada e com diferentes matizes no uso de modelos de linguagem com IA reconhecendo o papel essencial da expertise humana e da criatividade na formação das respostas produzidas.
Na sua publicação sobre Engineering vs. Design Thinking, Chinn (2017) argumenta que a engenharia e o pensamento de design compartilham processos e mentalidades semelhantes, como o pensamento crítico e a gestão de projetos, mas diferem em aspectos cruciais. A engenharia baseia-se no raciocínio dedutivo, enquanto o pensamento de design adota abordagens indutivas. No pensamento de design, as pessoas estão no centro do processo, trazendo consigo um grau maior de imprevisibilidade, ao passo que a engenharia lida com elementos mais estáveis, como os materiais. Os níveis de risco também diferem — projetos de engenharia envolvem riscos mais elevados, como o colapso de uma ponte, enquanto projetos baseados em pensamento de design, como o desenvolvimento de aplicativos, permitem a rápida criação de protótipos com consequências de baixo risco. Essa diferença de risco influencia a abordagem adotada nos testes: a engenharia prioriza a viabilidade técnica, enquanto o pensamento de design foca nos desejos e satisfação do usuário antes de considerar os desafios técnicos.
Até que Ponto Modelos de IA Podem Criar Prompts que Refletem Desejos e Intenções Humanas?
Pode-se argumentar que modelos de IA são capazes de gerar prompts eficazes. Por exemplo, o ChatGPT ou o modelo Claude podem ser solicitados a criar um prompt que produza determinado resultado desejado. Mas seriam esses prompts tão bons quanto os criados por humanos?
Nós argumentamos que um prompt gerado por IA possui limitações que um designer ou autor humano de prompts não tem. Por exemplo, os modelos de IA não conseguem incluir especificações contextuais que dizem respeito apenas ao prompter humano. O modelo não está familiarizado com os nossos contextos específicos de ensino aprendizagem… e não tem conhecimento sobre o perfil dos nossos estudantes (público-alvo), o que é essencial para a elaboração do prompt. Embora os modelos possam gerar prompts com informações contextuais, apenas o ser humano conhece verdadeiramente o contexto real — como o público-alvo ou critérios e restrições particulares dos contextos locais.
Para explorar as capacidades do ChatGPT na geração dos próprios prompts e o impacto disso na qualidade das respostas, realizamos uma experiência que revelou resultados bastante elucidativos. Aqui fica a descrição desta experiência.
Iniciamos fornecendo ao ChatGPT um trecho cuidadosamente elaborado e solicitamos que o modelo produzisse um prompt com base naquele texto. O ChatGPT atendeu ao pedido, gerando um prompt que, por sua vez, utilizamos para criar um novo texto. Esse novo texto refletia o tema e a estrutura do original, conforme esperado. Contudo, decidimos repetir o processo: alimentamos o segundo texto ao ChatGPT, pedindo um novo prompt. Desta vez, o prompt gerado se assemelhava ao primeiro, mas era visivelmente mais genérico. A cada iteração, conforme continuávamos o ciclo, surgiu um padrão evidente — os prompts tornavam-se progressivamente mais curtos e menos específicos, e os textos gerados cada vez mais vagos e sem um foco específico.
Ao repetir esta experiência com um texto diferente, obtivemos resultados igualmente problemáticos. Nesse caso, a cada nova iteração, os prompts tornaram-se mais longos e complexos, o que resultou em respostas mais extensas e detalhadas. Um ensaio que começou com 250 palavras chegou a ultrapassar 1500 palavras após apenas cinco iterações. A complexidade e o nível de leitura também aumentaram de forma acentuada, levando a um texto quase ilegível, redundante, excessivamente técnico, e apenas tangencialmente relacionado com o tema do texto original.
Em ambos os casos, ao longo do processo iterativo, a qualidade dos prompts gerados pelo ChatGPT não melhorou, resultando em conteúdos que se desviavam progressivamente do propósito inicial e mergulhavam em um ciclo de repetição e falta de originalidade, tornando-se inúteis para o usuário ou objetivo pretendido. Esse fenômeno sugere que, quando o ChatGPT é deixado para gerar seus próprios prompts sem intervenção humana, tende a reciclar ideias sem trazer novas perspectivas ou profundidade. Os resultados passaram a apresentar uma espécie de “endogamia criativa”, limitando a exploração do potencial completo do modelo e falhando em gerar respostas ricas e com diferentes matizes, que só podem emergir de prompts mais cuidadosamente elaborados.
A nossa experiência destaca um ponto crucial: a infusão de ingenuidade e criatividade humanas no processo de criação de prompts é essencial para ativar as respostas de maior qualidade que os modelos de IA podem oferecer. Prompts elaborados por humanos introduzem novas ideias, perguntas mais sofisticadas e contextos específicos que orientam o modelo na produção de conteúdos mais valiosos e direcionados. Ao confiar apenas na IA para gerar os próprios prompts, perde-se a oportunidade de explorar todo o seu potencial. Acreditamos que é justamente a intervenção humana, por meio do design criativo de prompts, que torna possível alcançar resultados únicos e de valor.
Apesar da aparente capacidade dos modelos de IA de gerar prompts, os prompts gerados por esses modelos carecem dos detalhes contextuais únicos que apenas o prompter humano possui. O modelo, por exemplo, não pode incluir informações sobre o público-alvo, situações específicas ou a experiência e habilidades particulares do usuário. Isso pode levar a resultados com informações errôneas. Assim como um computador não escreve seu próprio código, modelos de IA precisam de entradas (inputs) para produzir saídas (outputs)— e essas entradas exigem ingenuidade, capacidade de improvisação, criatividade e inteligência humanas.
Como Estruturar um Prompt de Qualidade?
Um prompt bem elaborado é aquele que estimula a criatividade humana e é adaptado às circunstâncias e contextos específicos do usuário. Considere as seguintes 5 práticas para o design de prompts de qualidade:
- Defina o seu público: Especifique o contexto e o público-alvo pretendido. Seja ele composto por estudantes, profissionais ou um público geral, isso influenciará o tom, a linguagem e o nível de complexidade da resposta (output).
- Aproveite experiências pessoais e expertise: Incorpore suas próprias experiências, habilidades ou conhecimentos no prompt. Isso orienta os modelos de IA a produzir conteúdos únicos e personalizados, alinhados com as suas perspectivas.
- Inclua situações específicas: Apresente perguntas detalhadas, variadas e provocadoras de reflexão. Mencione desafios ou cenários específicos ao seu contexto. Isso permite que os modelos de IA adaptem suas respostas para tratar essas questões de forma mais aprofundada.
- Declare suposições: Forneça os detalhes de contexto necessários e identifique quaisquer pressupostos que os modelos devam considerar. Ao incluí-los no prompt, os modelos têm uma melhor compreensão de seu raciocínio, o que contribui para uma resposta mais alinhada com os seus pontos de vista.
- Especifique o tom, o estilo e o formato desejado: Indique o tom preferido (por exemplo, formal, conversacional, acadêmico) e o formato (como ensaio, relatório, tópicos em lista) para que a resposta atenda às suas expectativas e se adeque ao contexto. Se possível, forneça exemplos do seu estilo de escrita para que os modelos de IA possam modelar a resposta conforme os seus padrões pessoais.
Ao incorporar essas práticas de forma consciente, o prompt é estruturado com a engenhosidade, criatividade e percepção contextual que os modelos de IA, por si só, não possuem, aproveitando plenamente as capacidades destes modelos e maximizando a relevância e singularidade das respostas geradas.
Design de Prompt: Uma Abordagem que Transcende a Engenharia
O Google Cloud (2024) distingue design de prompt de engenharia de prompt, tratando-os como atividades distintas, embora relacionadas. Enquanto a engenharia de prompt é um processo iterativo voltado para os procedimentos técnicos da interação com modelos de linguagem de grande porte, o Google sugere que o design de prompt é um processo mais artístico, com o objetivo de elicitar a resposta desejada do modelo de IA.
Em resumo, nós afirmamos que o design de prompt é um processo exclusivamente humano, responsável pela elaboração de prompts para modelos de IA generativa que resultem em respostas precisas, de alta qualidade e alinhadas às intenções humanas. Mais do que simplesmente inserir valores em uma fórmula, criar prompts bem estruturados é uma atividade intrinsecamente criativa e humana. Trata-se de uma habilidade multifacetada que exige adaptação, flexibilidade, pequenas variações e tem como base a criatividade. O design de prompt é a competência com maior potencial para desbloquear verdadeiramente o potencial — a “magia” — da inteligência artificial generativa.
Como citar este artigo:
CORREIA, Ana-Paula, HICKEY, Sean. A relevância do design de prompts na interação com inteligência artificial generativa. Notícias, Revista Docência e Cibercultura, Abril de 2025, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.
Sobre a autoria:
Ana-Paula Correia, PhD
Professora Titular na área da Tecnologia Educativa e Diretora do Centro de Educação e Formação para a Empregabilidade, The Ohio State University, Estados Unidos.
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0806-7835
Sean Hickey, PhD
Diretor-Adjunto do Programa de Avaliação no Centro de Educação e Formação para a Empregabilidade, The Ohio State University, Estados Unidos.
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-6993-2410
Editores/as Seção Notícias:
Felipe Carvalho, Edméa Santos, Marcos Vinícius Dias de Menezes e Mariano Pimentel