Educação Museal, Mediação e Museus de Ciências: perspectivas plurais

2024-05-28

Autoria: Ozias de Jesus Soares; Aline Lopes Soares Pessoa de Barros; Miguel Ernesto G. Couceiro de Oliveira; Suzi Aguiar; Tereza Amorim Costa

A pesquisa se apresenta como tema necessário e urgente na consolidação da multidimensionalidade da educação museal. Cabe destacar, de partida, que o alcance de tal horizonte é desafio de grande expressão. Firmou-se no contexto dos museus, por diferentes caminhos e momentos, uma concepção de educação museal marcada fundamentalmente pelo atendimento aos diversos públicos em situações de visitas às exposições e atividades correlatas. Nesse sentido, a forte presença do trabalho da mediação com públicos na educação museal deu destaque a tal dimensão em detrimento das demais. De outro lado, defende-se contemporaneamente que a educação museal, na sua multidimensionalidade, comporta dimensões teóricas e práticas, formação de mediadores, planejamentos, avaliação, registros, elaboração de materiais educativos, pesquisa e produção de conhecimentos. 

 Reconhecendo as várias dimensões da educação museal, emergem desafios em relação aos focos e temáticas sobre os quais a pesquisa neste campo devem se debruçar. Em outras palavras, por onde começar a investigar os aspectos que emolduram a educação museal sendo ela tão diversa? Em tempos recentes, observa-se uma coleção crescente de estudos que têm enriquecido as práticas e elaborações teóricas no campo museal. Tais estudos estariam diretamente ligados a um tríplice crescimento no campo dos museus no país: identifica-se um salto quantitativo na criação de instituições museológicas nas últimas décadas; ao lado deste, verifica-se um substancial crescimento da oferta de cursos de graduação em Museologia, somados a programas de pós-graduação que têm acolhido temáticas e objetos de estudos que orbitam a educação museal; e, o terceiro aspecto é a  recepção de temas da educação museal em diversos periódicos científicos que divulgam a produção de conhecimentos oriunda dos museus.

A riqueza da produção de conhecimentos e a proposição de práticas no campo museal é motivada, em especial, pela diversidade dos modelos temáticos e das tipologias dos acervos. Ademais, museus encontram-se na confluência entre diversas possibilidades de abordagens e de lugares sociais. Particularmente nos chamados museus de temática científica, o patrimônio cultural das ciências, a escola e seu currículo, os diversos tipos de público, as questões de saúde e ambiente, os debates sobre desenvolvimento tecnológico e a formação integral são elementos que atravessam as práticas e orientam as reflexões e teorizações.

É no contexto dessas ponderações que educadores do Museu da Vida Fiocruz (MVF) inauguraram um estudo que levou em conta a tarefa de atentar para os diversos atores que habitam a educação museal. O período compreendido de realização da pesquisa iniciou-se no ano de 2020, tendo sua conclusão prevista para o ano de 2024. A pesquisa evidencia a necessidade de compreender as diferentes perspectivas e expressões da educação museal, partindo das interpretações de mediadores, de professores e dos públicos. Nesse intento, foram eleitos dois grandes eixos de investigação: 1) as perspectivas colaborativas e formativas de mediadores e professores; e 2) as perspectivas da ação mediadora e dos públicos.

Em relação ao primeiro eixo, três questões emergem como orientadoras do estudo: 

  • Quais os sentidos atribuídos pelos mediadores às práticas de formação em educação museal e popularização da ciência das quais tomam parte?
  • Que impactos e indicadores podem ser elencados como resultado dos programas de formação dos diferentes estudantes bolsistas no Museu? 
  • Quem são e o que esperam do Museu os participantes dos programas voltados para professores no Museu da Vida?

No segundo eixo, as indagações inaugurais foram as seguintes: 

  • De que formas e como são as interações do público com as exposições e mediadores no contexto da visita a museus de ciências?
  • Quais são as estratégias e ações de que a mediação lança mão no campo da cibercultura? 
  • Que iniciativas podem ser identificadas e analisadas com respeito à produção de materiais e tecnologias educacionais aplicadas à mediação em museus de ciências? 

Os eixos e questões listadas foram orientados pelo objetivo maior da pesquisa acima referido. Derivado desse, separados em dois grandes grupos, um conjunto de objetivos específicos estruturou a pesquisa, conforme abaixo descritos: 

Grupo 1 – mediadores, professores e bolsistas

  1. Mapear o perfil e conhecer opiniões e expectativas do programa Encontro com Professores no Museu da Vida Fiocruz;
  2. Relacionar diferentes maneiras pelas quais ocorrem processos de formação de mediadores no Museu;
  3. Analisar resultados e impactos dos programas de estudantes bolsistas em formação no Serviço de Educação do Museu da Vida Fiocruz;

Grupo 2 – mediação e públicos 

  1. Descrever iniciativas diversas no campo da educação museal relacionadas à produção de materiais e tecnologias educacionais aplicadas à mediação em museus de ciências;
  2. Identificar estratégias e ações utilizadas pela mediação no campo da cibercultura em museus de ciências;
  3. Compreender as formas como os diversos públicos interagem com as exposições e mediadores no contexto de visita a museus de ciências

No plano metodológico, a pesquisa foi orientada por uma abordagem qualitativa e interpretativa dos fenômenos em análise. Para tal, percorremos caminhos que se iniciam em levantamento bibliográfico e documental, passando por aprofundamentos teóricos, aplicação dos instrumentos da pesquisa, análise dos dados e elaboração de relatórios de extroversão.

A produção de dados com mediadores foi realizada no ano inicial da pesquisa (2020), lançando mão de um questionário autoaplicado, tendo se servido da plataforma Microsoft Forms. Dos resultados da análise empreendida, duas ações são destacadas aqui: a primeira se assentou em oportunidade de formação para o grupo da pesquisa, composto por 14 educadores do Museu da Vida Fiocruz1. Isso representa dizer que durante os encontros sistemáticos do grupo, as questões emergentes a partir da análise dos dados foram trazidas como suporte de reflexões e reorientação de práticas. 

A segunda ação resulta das publicações já disponíveis e outro conjunto de análise em fase de elaboração tendo em vista o compartilhamento com o campo museal. Um primeiro texto tratou da realização de uma avaliação dos caminhos metodológicos da pesquisa, suas potencialidades e desafios (Oliveira et al., 2022). Uma segunda publicação versou sobre o perfil e os enunciados dos educadores do Museu da Vida Fiocruz. Nessa publicação, refletimos sobre a correlação possível entre perfil etário de educadores e suas experiências no campo da educação museal. Concluímos, no âmbito do recorte da pesquisa, que, em geral, as aprendizagens no/do cotidiano precedem as ações de formação sistemática ocorridas antes ou durante a atuação desses profissionais (Costadella et al., 2022). Na mesma direção, uma terceira publicação (no prelo) tratou de identificar quais formações e em que espaços os atuais mediadores estiveram envolvidos antes do ingresso no Museu da Vida Fiocruz. A partir do conjunto de respostas, buscamos compreender em que medida as experiências pregressas em espaços educativos antes de ingressarem no MVF teriam garantido a inserção desses educadores em processos de formação para a atuação na educação museal.

Além de tratamento e análise de um conjunto de enunciados presentes na primeira etapa da pesquisa (mediadores), a pesquisa encontra-se na fase de análise de dados produzidos a partir de questionário aplicado aos professores em contexto de visita com grupos. Queremos, com isso, continuar dialogando com os diversos atores praticantes do cotidiano da educação museal e compreender as diferentes perspectivas que habitam esse espaço de formação humana.

Notas:

1 - Somados aos autores deste texto, integram a pesquisa os seguintes educadores: Alex dos Anjos Arruda Junior, Ana Aparecida Costadella, Bianca Reis, Denyse Amorim de Oliveira, Gabriela Nascimento Santos Silva, Hilda da Silva Gomes, Maria Paula de Oliveira Bonatto, Cláudia de Araújo Oliveira e Edmilson Barcellos da Rocha. A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, em 09 de outubro de 2020, sob o número de parecer 4.331.256 (CEP/Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz) e tem o apoio financeiro da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.

Referências:

COSTADELLA, A. A.; OLIVEIRA, D. A.; SOARES, O. J. “Quem trabalha no ramo, aprende na prática”: considerações sobre formação, experiência e perfil etário de educadores museais. CADERNOS DO CEOM, v. 35, p. 226-238, 2022.

OLIVEIRA, C. A.; BONATTO, M. P.; ROCHA, E. B.; SOARES, O. J. Mediação e Mediadores na Educação em Museus: caminhos metodológicos na pesquisa. In: SILVEIRA, R. S. (Org.). Estudos em Educação: Inclusão, Docência e Tecnologias. 1ed. Formiga: Editora Uniesmero, 2022, v. 3, p. 9-23.

Sobre a autoria:

RxHfU6S.jpeg Ozias de Jesus Soares é Doutor em Ciências Sociais (UERJ), Mestre em Educação (UFF), Especialista em Formação de Educadores de Jovens e Adultos Trabalhadores (UFF); Especialista em Tecnologias para Educação Profissional e Tecnológica (IFSC); Pedagogo (UERJ); realizou Pós-doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É Pesquisador em Saúde Pública na Fiocruz (Casa de Oswaldo Cruz), atuando no Serviço de Educação do Museu da Vida Fiocruz. É docente na Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência da Casa de Oswaldo Cruz.

TeA3zgm.jpeg Aline Lopes Soares Pessoa de Barros é mestre em Divulgação da Ciência, Tecnologia e Saúde (PPGDC/Fiocruz) com ênfase na relação entre museus de ciências e a formação docente, especialmente no contexto da cibercultura. Especialista em Gestão da Saúde e Administração Hospitalar (Estácio de Sá) e graduada em Administração (UFRRJ). Educadora museal e entusiasta da Divulgação e Popularização da Ciência desde 2017, tem experiência nas ações de formação com estudantes e professores, no acolhimento do público, na produção técnica dos dados de visitação e na coordenação da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. Participa dos grupos de pesquisa: Educação Museal, Mediação e Museus de Ciência: perspectivas plurais e Educação Museus de Ciências e seus Públicos, ambos ligados ao Museu da Vida Fiocruz. Coordena o projeto Meninas Negras na Ciência (2020-2023) e, atualmente, coordena o Serviço de Apoio à Gestão, Infraestrutura e Operações no Museu da Vida Fiocruz.

QiXCBRz.jpeg Miguel Ernesto Gabriel Couceiro de Oliveira é Doutor em História das Ciências e Saúde (Fiocruz), Biólogo (UNICAMP) e mestre em Genética (UFRJ). É Tecnologista em Saúde Pública na Fiocruz, atualmente trabalha na área de Divulgação e Popularização da Ciência no Serviço de Educação do Museu da Vida Fiocruz. Trabalha na concepção de exposições, na produção de materiais interativos, na capacitação de mediadores e orientação de bolsistas. É docente na Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência (Fiocruz).

ewDtIJM.jpeg Suzi Santos Aguiar é Mestra em Divulgação da Ciência, Tecnologia e Saúde (Fiocruz). Pedagoga (UERJ) e Historiadora (PUC RJ). Docente na Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência (Fiocruz). É especialista em História da África e do Negro no Brasil pela Universidade Cândido Mendes; Especialista em Tecnologia Educacional nas Ciências e Saúde (UFRJ); Especialista em Docência do Ensino Superior pela AVM Faculdades Integradas. Atua no Serviço de Educação do Museu da Vida Fiocruz. Integra a Rede de Educadores em Primeira Infância em Museus e Centros Culturais - Rede PIMU. Integra a equipe educadores do Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos-IPN- RJ.

tW5ux5G.jpeg Tereza Amorim Costa é Doutoranda em Ciência da Informação (IBICT/UFRJ), mestra em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Graduada em Ciências Biológicas (UFSCar). Foi professora da rede pública de educação básica do Estado de São Paulo (2004/2005) e atua como autora e editora de livros didáticos de Biologia e Ciências para a educação básica. É Tecnologista em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz e Educadora no Museu da Vida Fiocruz.

Como citar este artigo: 

SOARES, Ozias de Jesus; BARROS, Aline Lopes Soares Pessoa de; OLIVEIRA, Miguel Ernesto G. Couceiro de; AGUIAR, Suzi; COSTA, Tereza Amorim. Educação Museal, Mediação e Museus de Ciências: perspectivas plurais. Notícias, Revista Docência e Cibercultura, maio de 2024, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.

Editores/as Seção Notícias:

Frieda Maria Marti, Felipe CarvalhoEdméa SantosMarcos Vinícius Dias de Menezes e Mariano Pimentel