ANDANÇAS DE UM APRENDIZ DAS FILOSOFIAS EM MEIO A DISTINTOS CAMPOS DE VIVENCIAS, CONHECIMENTOS E ATUAÇÕES

2024-05-24

Autoria: Iguatemy da Silva Carvalho

É inegável hoje o grande potencial cultural, da chamada “sabedoria popular”, isso por conta de múltiplas possibilidades de aprendizados que ela também nos propicia, restaurando uma relevante interatividade entre a subjetividade e a coletividade, pontes entre a ética e a moral, fortalecendo a identidade e pertencimento do nosso agir-atuar-criar com o que de mais singular existe no vivido. Algo que possibilita aprendizados mais reflexivos e críticos sobre a realidade, restituindo relevantes especificidades e dinâmicas, presentes na mesma, capazes de revelar um intenso jogo de força e poder, regras e normas de manipulação, que nos fazem viver num modo automático, sendo sempre definidos e falados por outrem.

Penso ser uma sapiência “popular” repleta de reflexividades e problematizações sobre o nosso existir nos colocando frente a frente com o que de mais íntimo somos, fazendo-nos ponderar sobre a responsabilidade
social das nossas ações, na formação do nosso caráter, trazendo-nos a compreensão de que somos pedaços de memórias, histórias, vivências e tempos, sendo passagem, caminho, possibilidades de um por vir, sempre inseridos em dinâmicos e conflituosos devires, interligando o passado, o presente e futuro. Uma sabedoria tão significativa quanto qualquer outra, apoiando também à construção da nossa qualidade como sujeitos culturais.

Chego a tais ponderações pelo fato de ter construído em minhas andanças, em distintos campos de conhecimentos, governamentais e não governamentais, a condição de um artista-educador, contínuo aprendiz das filosofias, hoje, um pesquisador dos impactos, afetamentos e afecções erigidos nessas caminhadas, colocando-me sempre diante das incessantes querelas dadas na relação cultura, educação e homem, atuando agora a frente da gestão de uma Casa de Cultura Popular do Estado do Maranhão, por nome de Casa do Maranhão.

Fato que resultou num trabalho de dissertação de Mestrado em Cartografia Social e Políticas da Amazonia pela Universidade Estadual do Maranhão, com o tema: “Narrativas e reflexividades: vivências num campo de distintas identificações, conhecimentos e atuações”1 , o qual creio ser pertinente socializar neste momento um breve resumo de seu teor pelo fato de se discutir a relação museus, educação e pesquisa na 22a Semana Nacional de Museus, externando a visão de um amante de sua cultura e um mix de lutas, reivindicações, tensões e conflitos, tomando o amor e a empatia como “armas” contra um estruturalismo funcional promovedor principalmente do racismo completamente desrespeitoso a diversidade cultural.

Uma análise com a devida cautela de não ser um autobiografismo, uma descrição egocêntrica, buscando-se problematizar, contingências e arbitrariedades da conturbada e confusa maneira de nos identificarmos enquanto atributo e não como ser, um resultado, assim penso da falta de autoconhecimento e de vínculos com nossas raízes primeiras, investigando-se ainda um poder de fala e deliberação de cada momento do “Eu” acima mencionado, construindo socialmente a pesquisa, refletindo como as tensões e intercessões estabelecidas nesse processo fomentam ao mesmo tempo um sujeito – objeto da investigação, numa relação nada homogênea e hegemônica. Uma discussão a qual trago para o debate três momentos:

O primeiro apresentando quem é o pesquisador da dissertação, a categoria do discurso o qual parte para a análise da pesquisa, primando pela complementação de aprendizagens socialmente construídas na sua vida como um sujeito do conhecimento seja acadêmica, seja em vivências de um cotidiano nada simplório ou de seu processo de maturação espiritual, a fim de refletir e problematizar, sobre o procedimento de se descrever e escrever como um pesquisador com diferentes pertencimentos, atuando como diretor da Casa do Maranhão.

Enfim trata-se da apresentação de um pesquisador inserido numa episteme institucional sem perder seu forte vínculo identitário com a sabedoria “popular”, em busca de um amadurecimento, não se eximindo da crítica proposta, permitindo o acesso a compreensão de dentro e fora de determinadas estruturas, e mecanismos de ação que regem a administração cultural do Estado do Maranhão. Tem-se as aprendizagens em suas andanças, encontros e reencontros primeiramente como cura de males deixados por uma nefasta ideologia colonial de despertencimento com uma diversidade cultural, ainda imperante em tempos atuais, combatendo-as via propostas de um autoconhecimento, socializando os resultados de suas pesquisas de campo e problematizações sobre sua posição como diretor de uma Casa de Cultura do Estado.

O segundo momento, refere-se ao campo burocrático da pesquisa, analisando as relações de poder, força e campo de disputa presentes na Casa do Maranhão, envolvida em situação de tensões geradas pelos atos e ações do Estado determinado por um grupo de fisiologistas políticos, construindo-se problematizações e reflexões sobre suas contingentes e utilitárias maneiras de entender a realidade vivida, seus habitantes, assim como, as relações estabelecidas em tal contexto, desconsiderando-as com algo socialmente construído, anulando suas especificidades e qualquer possibilidade de afronta a seu projeto de pilhagem de bens, para satisfação de anseios particulares. Um momento para se entender quem é esse Estado e como ele atua diante de seus dissensos.

Trata-se de um etnograr com fins a apresentar a situação neocolonial a qual o pesquisador parte, hierarquizando as tensões dadas em tal realidade, descrevendo a partir das políticas culturais específicas destinadas à Casa do MA. Analisando-se a ideia do ser essencializado e um estar politicamente instrumentalizado, pontuando a mediocridade de vida ao se se escolher compactuar e/ou se manter passivo diante da normalização de condutas e práticas corruptas e aversas a um pluralismo cultural, assim como as consequências de um posicionar-se criticamente as suas incoerências e nada governamentais da cultura dissipando toda a vida de si.

E por fim, o terceiro momento apresentando-se o campo cultural da pesquisa, uma descrição etnográfica sobre intervenções do Estado, no tocante ao domínio das produções artísticas e culturais do Maranhão, reificando sempre nesse processo a ideia de cultura como um poder geralmente dividida em dois grandes eixos, a erudita tida como a fonte oficial e a popular englobando conhecimentos, práticas, vivências dadas num cotidiano, vistas geralmente como conhecimentos de um senso comum sem muita relevância aos ditames oficiais de sabedoria, ponto este debatido com mais afinco, refletindo-se sobre sua condição de equidade dessa sapiência “popular” a conhecimentos acadêmicos, considerando-os também como artísticos, políticos, científicos e filosóficos. Ponderações estas obtidas ao lidar com a Exposição Saberes Tradicionais e Etnografia dos povos de comunidades tradicionais da região amazônica e Maranhão e seus parceiros2 , desde 2016 na Casa, com múltiplas formas de autorrepresentação e compreensão sobre memórias e histórias em seus museus vivos, Centros de Ciências e Saberes, fazendo parte de seu circuito até hoje, sem necessariamente, pertencer a mesma, referendado a atuação da gestão da Casa do Maranhão ao executar suas obrigações institucionais, reiterando a avaliação de um contexto repleto de oposições de caráter não destrutivo, imprescindível para se explanar um debate sobre o sentido e significado de cultura como um agregado das mais variadas áreas de expressão e interpretação do saber e fazer humanos.

Enfim, um contexto que promoveu uma espécie de auto cartografia do meu Eu analisando a atuação do seu ser - estar, diante de práticas engessadas e mecânicas de administração cultural do Estado do Maranhão, transformando as desassistências em algo fecundo a criação de estratégias, a fim de, não sucumbir aos ditames de uma realidade política de naturalização de estatização do humano. Uma realidade de lutas fortalecidas via vivências adquiridas de dentro e fora do âmbito institucional da museologia maranhense, buscando empregar experiências educativas e informais com pretensão de transformar a Casa do Maranhão em um laboratório de ações itinerantes e transversais do conhecimento. Algo que penso ser a responsabilidade social da atuação do artista-educador, andarilho-aprendiz das filosofias que vos escreve.

Notas

1 - PPGCSPA | IGUATEMY DA SILVA CARVALHO – NARRATIVAS E REFLEXIVIDADES: VIVENCIAS NUM CAMPO DE DISTINTAS IDENTIFICAÇÕES, CONHECIMENTOS E ATUAÇÕES. (uema.br) 

2 - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Museu de Astronomia e
Ciências Afins. Programa Nacional de Cartografia Social e Políticas da Amazonia. Universidade
Estadual do Amazonas. Universidade Estadual do Maranhão.

Sobre a autoria:

8BnZds4.jpeg Iguatemy da Silva Carvalho é filho biológico de Luzia Viana da Silva e José Batista de Carvalho e do axé do Ilé Agbára Omi Nàná-Bùkúù. Integrante do Coletivo Dan Eji. Artesão. Matraqueiro do Boi Sotaque da Ilha do MA. Graduado em Filosofia pela UFMA e Prof. Ms. em Cartografia Social e Políticas da Amazônia pela UEMA. Integrante da Rede de Educadores em Museus do Brasil e do Maranhão e atualmente estar com Diretor da Casa do Maranhão, órgão do Estado vinculado à Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão.  

Como citar este artigo: 

CARVALHO, Iguatemy da Silva. ANDANÇAS DE UM APRENDIZ DAS FILOSOFIAS EM MEIO A DISTINTOS
CAMPOS DE VIVENCIAS, CONHECIMENTOS E ATUAÇÕES. Notícias, Revista Docência e Cibercultura, maio de 2024, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.

Editores/as Seção Notícias:

Frieda Maria Marti, Felipe CarvalhoEdméa SantosMarcos Vinícius Dias de Menezes e Mariano Pimentel