Os Museus de Ciência como Promotores do Engajamento de Meninas Normalistas com Ciência e Tecnologia

2024-05-21

Autoria: Aline Martins; Monica Santos Dahmouche; Simone Pinheiro Pinto; Monica Lacerda; Amanda Silva

O Museu Ciência e Vida vem, desde 2014, se dedicando ao desenvolvimento de ações que joguem luz sobre o binômio gênero-ciência, especialmente relacionado à presença das mulheres nas ciências exatas. A primeira iniciativa foi a organização e execução da exposição “Pioneiras da Ciência no Brasil", inspirada no livro homônimo editado pelo CNPq (Dahmouche, 2022).  

Em 2019, o Museu Ciência e Vida, em parceria com  o Campus UFRJ - Duque de Caxias, iniciou um conjunto de atividades de promoção da cultura científica para impulsionar a inserção de meninas e mulheres nas áreas de ciências exatas, engenharias e computação. Como uma ação de território, ambas instituições se uniram para atrair as jovens das escolas públicas da região para participarem do projeto Meninas nas Exatas da Baixada Fluminense, com atividades na universidade e no espaço museal (Dahmouche, 2024). O desenvolvimento dessas ações foi voltado para 15 alunas e cinco professores de cinco escolas públicas de Duque de Caxias, além de três alunas universitárias, da UFRJ. Foram desenvolvidas diversas ações práticas de nanotecnologia nos laboratórios da URFJ - DC, atividades de divulgação científica e promoção da cultura científica no museu, bem como exibição de exposições e mesa redonda sobre o tema, nas cinco escolas (Dahmouche et al, 2022; Lacerda et al, 2022). As atividades nas escolas foram mais abrangentes, abertas ao público escolar interessado no tema. A iniciativa teve financiamento do CNPq, em 2019,  e da Faperj em 2022. 

Como desdobramento desse movimento, em 2022, o Museu Ciência e Vida, mantendo a parceria, organizou o primeiro Hackathon Meninas Normalistas, voltado exclusivamente para estudantes dos cursos de formação de professores, no âmbito do ensino médio (Dahmouche; Pinto, 2022). A motivação para o desenvolvimento do hackaton para meninas (cis, trans e que se identifiquem como gênero feminino), estudantes do curso de formação de  professores, foi oferecer a estas jovens a oportunidade de unir ciência e robótica, possibilitando uma variedade de descobertas entorno dos conteúdos curriculares das disciplinas do ensino formal em um ambiente diferenciado da sala da aula, corroborando com a abordagem STEM, onde as participantes são provocadas a resolver problemas e desafios do cotidiano propondo soluções. Esta iniciativa pretendeu contribuir para reflexões sobre ciência e tecnologia no espaço museal e para desmistificar a ideia de que ciências exatas são áreas do conhecimento de domínio masculino. Cabe destacar que a carga horária de ciências na formação de professores é de apenas 800h, divididas ao longo de todo o curso, enquanto no ensino médio a carga horária média é de 1300h. Ou seja, as estudantes normalistas têm menos contato com os conteúdos de ciência, e consequentemente ficam com uma lacuna de formação nesta área. Os reflexos são observados, principalmente, nos anos iniciais do ensino fundamental, que ainda apresentam em seus quadros professores sem formação superior. Dados do Censo Escolar de 2020 mostram que, no país, 14,7% dos docentes possuem formação de nível médio normal ou magistério. Percentual similar, 14,3%, é observado na educação infantil (INEP, 2022). Observando os dados de 2023 dos quatro municípios que têm escolas participantes no Hackathon Meninas Normalistas (HMN), o percentual de professores desses períodos escolares sem formação superior em Duque de Caxias, Queimados, Rio de Janeiro e São João de Meriti são, respectivamente, 48,2%, 49,1%, 24,6% e 67,0%. Todos superiores à média nacional de 2020 (INEP, 2023).  

A primeira edição do Hackathon Meninas Normalista foi desenvolvida em dois dias, divididos em três etapas: apresentação do pitch, do vídeo e do produto final.  No primeiro dia, inicialmente houve um momento de acolhimento com um café da manhã de boas-vindas, seguido de uma apresentação das etapas do Hackathon Meninas Normalista, apresentação das alunas e professoras participantes, seguido de uma roda de conversa com duas cientistas que são educadoras museais com formação em ciências exatas e engenharia. As estudantes vivenciaram a experiência de visita mediada às exposições do Museu Ciência e Vida, ao conjunto de dez módulos de experimentos simples aplicáveis aos anos iniciais da educação e à sessão de cúpula do planetário da instituição. No segundo dia, as estudantes apresentaram o pitch sobre o produto que elas pretendiam desenvolver. Na sequência, elas participaram de uma palestra sobre robótica na educação infantil e o uso da plataforma micro:bit1.  Dando continuidade, as alunas desenvolveram um vídeo sobre o produto final mostrando o processo de elaboração, que foi completamente desenvolvido no museu.  Ao final do dia, cada grupo apresentou seu produto final, conforme mostrado na Figura 1.

Figura 1 - Integrantes da equipe Nina da Hora, do Instituto Carmela Dutra, vencedora do Hackathon Meninas Normalistas, 2022, apresentando o produto produzido na competição.

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                                                                                 Fonte: autoras

Trabalhar com atividades transdisciplinares que possibilitem o uso da criatividade e inspirar o uso da Robótica Educacional, que tem o poder de se tornar um instrumento capaz de estimular o interesse por ciência e tecnologia potencializa a promoção de novos talentos para a ciência. As estudantes do Hackathon Meninas Normalista vivenciaram momentos ímpares, que proporcionaram o contato com a robótica, por meio do uso do Lego e do micro:bit e com o espaço museal, por meio de oficinas e visita às exposições.  Esta vivência pode ter desdobramentos no desenvolvimento da profissão junto às suas futuras alunas, como pode ser um diferencial para a conquista do primeiro emprego.

Na primeira edição do Hackathon Meninas Normalista, em 2022, seis grupos de estudantes de escolas dos municípios do Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Queimados e São João de Meriti participaram do evento, enquanto na edição de 2024 foram oito grupos do Rio de Janeiro, Duque de Caxias e Queimados. Estes eventos marcam o espaço que as estudantes de formação de professores têm no Museu Ciência e Vida, o que reforça sua missão de ser um espaço de apoio ao professor.

Notas:

1 - https://microbit.org/pt-br/

Referências:

Dahmouche, M. S.; Pinto, S. P.; Silva, C. S.; Jordão, T. Exposições sobre Mulheres na Ciência: divulgação científica e inclusão social de gênero. Revista Brasileira de Educação, Tecnologia e Sociedade, v. 15, n. 2, p. 237- 253, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.14571/brajets.v15.n2.237-253.

Dahmouche, M.; Pinto, S. P. HACKATHON MENINAS NORMALISTAS – UM POSSÍVEL CAMINHO PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS. Anais do II Simpósio de Educação em Ciências. 2022. Disponível em: https://b5596dc0-07a1-4dd1-afbc-f74c1d0d43a5.filesusr.com/ugd/a946c5_7509337710a3476aaa2a2db0ec8eaf60.pdf Acesso em: 22 abr. 2024.

Dahmouche, Mônica Santos; Lacerda, Monica; Pinto, Simone Pinheiro; Lopes, Thelma. Museu, universidade e escola: tríade para promoção de meninas em STEM. Em Questão, Porto Alegre, v. 30, e-132879, 2024. DOI: https://doi.org/10.1590/1808-5245.30.132879

Dahmouche, M. S.; Lacerda, M.M, Suguihiro, N.M, PINHEIRO PINTO, S.; LOPES, T. Meninas na Baixada Fluminense: dos Laboratórios da UFRJ ao Museu Ciência  e Vida. In: Dahmouche, M.S. Exatas é com elas: Tecendo redes no estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 2022. 63-86. Disponível em: https://www.cecierj.edu.br/wp-content/uploads/2022/05/livro_meninas_exatas.pdf

INEP. Censo Escolar: Pesquisa revela aumento de escolaridade dos docentes. 2022. Disponível em: https://tinyurl.com/y4f4fkrv .  Acesso em: 23 abril 2024.

 INEP. Censo Escolar: Resultados. Disponível em: https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-escolar/resultados. Acesso em: 23 abril 2024.

Lacerda, M.M, Suguihiro, N.M, Dahmouche, M.S. NANOTECNOLOGIA POR ELAS PARA TODOS. In Alves, Lucineia. Professores Inovadores IV. Rio de Janeiro, RJ: Autografia, 2022. 51 - 67.

Sobre a autoria

Nuspm6n.jpeg Me chamo Aline Martins,  minha jornada profissional e acadêmica tem sido uma aventura repleta de aprendizado e descobertas. Desde o início, meu interesse pela interseção entre ciência, tecnologia e educação tem me impulsionado. Como Engenheira Eletricista, mergulhei no mundo da tecnologia com entusiasmo. No entanto, foi durante a minha passagem pela FAETEC Bacaxá/ Saquarema e no meu mestrado em Ciências e Tecnologias Ambientais que percebi minha paixão pelo ensino e pela divulgação científica. Atualmente, como doutoranda em Ensino de Ciências, concentro minha pesquisa em Robótica Educacional, explorando como essa ferramenta pode ser eficazmente integrada em espaços não formais, como museus de ciência. Minha experiência como mediadora no Museu Ciência e Vida tem sido fundamental para entender o potencial educacional desses ambientes dinâmicos e interativos.

kKrCol8.jpeg Mônica Santos Dahmouche é docente da Fundação Cecierj, foi responsável pelo processo de implantação do Museu Ciência e Vida, esteve a frente da vice-presidência científica por 12 anos.  é docente do programa de mestrado em divulgação da ciência, tecnologia e saúde, da Fiocruz em parceria com a Fundação Cecierj, MAST, assim como do curso de especialização em divulgação e popularização da ciência.  Integra a rede de mulheres em STEM do Rio de Janeiro e desenvolve pesquisas acerca de estratégias para atrair meninas para as ciências exatas e pesquisas de público, voltadas especialmente para museus de ciências. É mãe de duas jovens mulheres.

TAC6Haw.jpeg Simone Pinto é licenciada em Física pela Universidade federal do Rio de Janeiro, mestre em Ciências pelo Instituto Oswaldo Cruz/FIOCRUZ e doutora em Educação em Ciências e Saúde pelo Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências e Saúde - NUTES/UFRJ. Professora da rede estadual lotada no Colégio Estadual José Bonifácio em Niterói. Servidora da Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro atuando no  setor educativo do Museu Ciência e Vida e como docente do curso de Pós-graduação Lato Sensu em Divulgação e Popularização da Ciência. Desenvolve trabalhos na área de ensino de Física, Formação de Mediadores, Formação Continuada de Professores, Educação em Centros e Museus de Ciências.

GWJX1ip.jpeg Mônica M. Lacerda é Professora Associada da UFRJ, Campus Duque de Caxias, Física, pesquisadora permanente do programa de pós graduação em Formação em Ciências para Professores, membro do Núcleo Multidisciplinar de Pesquisa em Nanotecnologia (Numpex - nano), da rede de Mulheres em STEM do Rio de Janeiro e da Rede Nacional de Mulheres Cientistas. Desenvolve trabalhos nas áreas de ensino - como problemas contemporâneos de educação, desenvolvimento de material didático e paradidático e divulgação científica - e de nanociências, com especial interesse no estudo de propriedades estruturais de materiais antiferromagnéticos e na interação entre os quanta de propagação de spin e de vibração da rede cristalina. Promove atividades acadêmicas nas áreas de Ciências Exatas para meninas de escolas públicas. Casada e mãe de uma estudante de Física.

rsZGeE6.jpeg Amanda Santos é bióloga e mestranda em Ensino de Ciências (IFRJ/2023). Atua em espaços não formais de educação desde 2015. Possui experiência em popularização da ciência em planetários e museus. Atualmente é Educadora Museal no Museu Ciência e Vida, com atividades correlatas às demandas do setor Educativo.

Como citar este artigo: 

MARTINS, Aline; DAMOUCHE, Monica Santos; PINTO, Simone Pinheiro; LACERDA, Monica; SILVA, Amanda. Os Museus de Ciência como Promotores do Engajamento de Meninas Normalistas com Ciência e Tecnologia. Notícias, Revista Docência e Cibercultura, maio de 2024, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.

Editores/as Seção Notícias:

Frieda Maria Marti, Felipe CarvalhoEdméa SantosMarcos Vinícius Dias de Menezes e Mariano Pimentel