O Programa de Educação do Museu do Amanhã: tecendo futuros e convivências

2024-05-07

Autoria: Júlia Mayer; Lais Daflon; Maria Luiza Lopes; Thainá Nunes; Vinícius Valentino

A sustentabilidade e a convivência são eixos estruturantes do Museu do Amanhã, um museu de ciências contemporâneo localizado na Praça Mauá no Rio de Janeiro, com conteúdos e questionamentos sobre a época de grandes mudanças sociais e ambientais em que vivemos e reflexões sobre os diferentes caminhos que se abrem para o futuro. O Museu se posiciona como um espaço de interação e diálogo de ideias, disseminação de conhecimento e instigação de questionamentos diante das significativas transformações que caracterizam a era atual. Como uma instituição que se orienta por perguntas e fomenta diálogos, se afirma como um museu educador e um ponto para confluência junto a diversos públicos.

Neste contexto, o Programa de Educação do Museu do Amanhã1 tem como missão estimular a transformação das nossas relações com o planeta e com as pessoas, por meio da formação em habilidades para a transformação. Dessa forma, os visitantes são instigados a pensar os desafios do Amanhã, a partir da ciência, da democracia e do pensamento crítico, articulando os temas e questões apresentados pelo museu aos saberes, histórias e individualidades dos visitantes de forma não-hierárquica, visando a equidade e autonomia. Para isso, apresenta uma série de projetos com o intuito de democratizar acessos, diversificar seus públicos e propor imersões experimentais e formativas através de suas práticas de mediação2, além de proporcionar formações interdisciplinares, contribuindo significativamente para o desenvolvimento profissional de seus educadores. Os educadores se dividem em dois Grupos de Pesquisas e Práticas (GPP) voltados para o desenvolvimento de práticas educativas com foco em dois perfis de público: infâncias e famílias; escolas e territórios. As ações e pesquisas produzidas pelos grupos são propostas com base nos eixos curatoriais do museu, além de efemérides e conceitos pensados pela equipe em um processo contínuo de formação sobre os temas abordados, em diálogo com a exposição de longa duração e as exposições temporárias, a partir das práticas da educação museal. O GPP Infâncias e Famílias proporciona experiências educativas investigando o papel dos museus como incentivadores do desenvolvimento orgânico, cognitivo e emocional das crianças, abordando temas diversos e apresentando-as para novas possibilidades de futuros. Já o GPP Escolas e Territórios realiza ações que buscam estreitar os laços com a comunidade local e escolar, debatendo ciência e cidadania de forma pluriversal.

As atividades são pensadas desde o início para todos os participantes, partindo das setes dimensões da acessibilidade e do desenho universal para o aprendizado3. O uso de jogos, materiais táteis, descrição de imagens e a presença de intérpretes de Libras para comunicação entre a equipe e o público participante são características essenciais para a realização de nossas atividades. O destaque dado à acessibilidade durante as atividades tem sido bem recebido pelos públicos e entendemos que este caminho é necessário para que públicos com deficiência vivenciem os museus. 

As Visitas Mediadas são voltadas para públicos diversos, com diferentes tipologias e modalidades de acesso, a partir de  novas proposições  sensoriais e estéticas a partir de objetos mediadores ou práticas de mediação, possibilitando não apenas o acesso ao conteúdo do museu, mas também a experiência do visitante, a fruição e o compartilhamento de saberes. As visitas agendadas podem acontecer presencialmente ou na modalidade de Televisita, com os educadores mediando dentro da exposição e o público participando online; a visita Trilhar os Amanhãs, que é voltada para o público espontâneo, acontece sem necessidade de agendamento, em horários pré-estabelecidos pelo Programa; já as Imersões convidam os visitantes a mergulhar de maneira envolvente nas narrativas museais através de proposições educativas que incentivam uma conexão ampliada com conteúdos específicos e experimentações dentro das exposições - nesse sentido, recorremos ao conceito de Curadoria Educativa apresentado por Luiz Guilherme Vergara4 e dialogado com Mirian Celeste Martins5.

Museu na Rua são visitas mediadas pelas ruas vizinhas ao Museu do Amanhã que abrem outras possibilidades de compreensão dos eixos Sustentabilidade e Convivência, eixos curatoriais estruturantes, junto aos públicos. As visitas ao ar livre proporcionam uma maior conexão com o espaço e geram reflexões sobre as estruturas e relações que acontecem no ambiente. Por meio de movimentos, encruzilhadas, ensinamentos e escuta atenta, são estabelecidos diálogos com os visitantes pelos percursos realizados nos encontros. Ainda parte do projeto Visitas Mediadas e em diálogo com a Lei Municipal 6.278/20176, desde 2018 o Museu do Amanhã realiza as Visitas Cognitivas-Sensoriais, que busca experimentações diversas a partir de diferentes formas cognitivas e sensoriais de vivenciar o museu. É destinada à pessoas autistas, com deficiência intelectual ou outras especificidades do neurodesenvolvimento, junto a seus acompanhantes. As visitas acontecem sob agendamento em horário ampliado de funcionamento do museu, com uso de objetos mediadores adaptados às especificidades do público agendado e indo ao encontro dos interesses dos visitantes. Vale ressaltar que os públicos neurodiversos não são limitados somente a essas visitas, mas são bem-vindos em toda a programação, inclusive de outros projetos.

Como parte estrutural da concepção das metodologias e tipologias de visitas mediadas, a área de Educação do Museu articula o programa de formação Trilhas de Conexão que se divide em duas frentes: a primeira estrutura a formação interna de seus educadores com temáticas específicas e, a segunda, convida professores para encontros de formação relacionados aos temas trabalhados pelo museu. Nos encontros, para ampliação do ciclo formativo e relacional, são realizados sorteios de ônibus para professores representantes de escolas públicas do Rio de Janeiro, para que possam trazer suas turmas para visitas mediadas no Museu do Amanhã.

No âmbito das ações educativas, aposta-se em uma definição por três conceitos: Curiosar, conviver e experienciar, em que compreende-se como alguns dos princípios básicos para o desenvolvimento humano. E é com essa ideia que o Programa de Educação do Museu do Amanhã propõe as atividades do projeto Brincar é Ciência, iniciado em 2022, composto por uma série de atividades em diferentes metodologias e voltado para conteúdos e públicos de faixas etárias diversas: Rolê STEAM, Clube da Horta, Pequenos Terráqueos e Amanhã de Histórias e Experimentações do Brincar. Este último ocorre em consonância às  férias escolares e feriados, evidenciando a importância das relações, dos espaços de convivência e do brincar como ferramenta de curiosidade e de experimentação. 

O Rolê STEAM tem o objetivo de promover o engajamento das crianças sobre as principais problemáticas que atravessam nossa atualidade, fomentando nelas a busca por suas soluções tendo como referencial a metodologia STEAM - do inglês, Science, Technology, Engineering, Arts, Mathematics -, trazendo jogos, vídeos, debates e atividades práticas para solucionar problemas do cotidiano. 

O Clube da Horta acontece desde 2021, em diálogo com a Horta do Amanhã, com atividades sobre educação ambiental, biodiversidade, relações interespécies, entre outros assuntos relacionados. A Aldeia Vertical e a Providência Agroecológica7 foram alguns dos parceiros principais desta frente. Já o Pequenos Terráqueos proporciona experimentações sensoriais para bebês e crianças de até 6 anos, acompanhados de seus familiares e no  Amanhã de Histórias a proposta é, através da contação de histórias, compartilhar narrativas mitológicas, históricas e contemporâneas que expressam distintas realidades que coexistem neste planeta que habitamos.

O projeto Meninas de 10 anos, inaugurado em 2018, é voltado para meninas entre 10 e 16 anos, de diferentes realidades sócio-econômicas do Rio de Janeiro. Desde 2021, o tema Emergências Climáticas é trabalhado por meio de diferentes metodologias, tais como jogos teatrais, rodas de conversa e criação de mapa afetivo. Cada encontro também conta com a presença de uma formadora cientista que é pesquisadora de temas relacionados ao projeto. 

O projeto Entre Museus é um projeto de democratização do acesso e de mobilização social e cultural junto às escolas vizinhas ao Museu do Amanhã que se desdobra em uma série de ações para alunos e professores de escolas e organizações sociais da região portuária do Rio de Janeiro, vizinhos do Museu do Amanhã, com uma programação de visitas mediadas ao Museu do Amanhã, a outros museus da cidade, parceiros do projeto, e o percurso entre eles reconhecendo a cidade como um museu a céu aberto. 

Desde 2022, ocorre também o Entre Museus Acessíveis (EMA), que é uma extensão do projeto Entre Museus, voltado para públicos de pessoas com deficiência que se dedica a ampliar as políticas de inclusão e a democratização do acesso em museus e centros culturais. Além da visitação aos museus, o projeto investe em visitas mediadas pelas ruas que conectam o Museu do Amanhã com um museu parceiro através de rotas históricas da cidade, com bicicletas acessíveis. Para ampliar a autonomia do público participante, o projeto incorpora recursos digitais, incluindo vídeos em Língua Brasileira de Sinais e audiodescrição para os museus parceiros participantes.

A partir de 2023, dentro do projeto,  foi desenvolvido o “Não toque! Curso-diálogo para ocupar museus”, uma proposição que parte dos processos de análise e diagnóstico do impacto do projeto junto ao Programa de Educação em parceria com a Comissão Entre Museus de Acessibilidade8 implementada desde a concepção dessa vertente. O curso-diálogo tem como objetivo fomentar a formação de pessoas interessadas, majoritariamente pessoas com deficiência, em práticas de educação museal comprometidas com o enfrentamento ao capacitismo em instituições culturais.

Em 2024, o Programa de Educação se aproximou da área de Comunidades e Territórios do Museu do Amanhã, responsável pelas práticas socioculturais junto aos vizinhos da região vizinha ao Museu do Amanhã, dentre outras funções específicas, para uma nova parceria. Nessa proposta, foram realizadas visitas mediadas, oficinas, atividades práticas e visitas externas em exposições com os projetos Uma só Voz e Transportar9

O Programa Educativo do Museu do Amanhã reafirma seu compromisso com a educação, proporcionando oportunidades consistentes para aprendizado e práticas de diferentes tipologias ainda mais democráticas e abrangentes com uma equipe diversa de educadores que estarão aptos a compor um museu que verdadeiramente receba a diversidade de públicos que compõem e podem compor um museu.

Notas:

1- A equipe de Educação de 2024 é composta pelos educadores Bianca Paes, Bruno Baptista, Diana Magalhães, Eduarda Emerick, Fernanda Castro, Jéssika Santana, Juan Barbosa, Júlia Mayer, Juliana Camara, Maria Luiza Lopes, Renan Freira, Thainá Nunes, Vinicius Andrade e Vinicius Valentino, as estagiárias Laura Taboni e Nicolle Portela, além da equipe administrativa que conta com o analista Darlan dos Santos, os assistentes Marcus Andrade e Nicolle Soalheiro, o Jovem Aprendiz Erik Dias, a coordenadora Lais Daflon e a gerente de Educação Camila Oliveira.

2- Para mais informações sobre as atividades e visitas do Educativo do Museu do Amanhã, acesse https://museudoamanha.org.br/programacao ou envie um email para visitas@museudoamanha.org.br.

3 - O que é Desenho universal para aprendizagem?

4 - VERGARA, Luiz Guilherme. Curadoria educativa: Percepção Imaginativa/Consciência do Olhar. In: Caderno de Mediação. Pablo Helguera (org.). Porto Alegre: Fundação Bienal do Mercosul, 2011. p. 57-60. VERGARA, Luiz Guilherme. Curadorias Educativas. Rio de Janeiro- Anais ANPAP, 1996. Disponível em: http://anpap.org.br/anais/2007/2007/artigos/105.pdf.

5 - MARTINS, Mirian Celeste (coord.). Curadoria educativa: inventando conversas. Reflexão e Ação – Revista do Departamento de Educação/UNISC - Universidade de Santa Cruz do Sul, vol. 14, n.1, jan/jun 2006, p.9-27. Disponível em: http://fvcb.com.br/site/wp-content/uploads/2012/05/Canal-do-Educador_Texto_Curadoria-Educativa.pdf 

6 - LEI Nº 6.278, DE 21 DE NOVEMBRO DE 2017. Institui horário exclusivo para visitação de Pessoas com Deficiências Intelectuais e/ou Mentais em museus e casas culturais do Município. 

7 - A Aldeia Vertical está localizada no bairro Estácio. Nesse território, Dauá Puri coordena o Museu da Cultura Puri (MCP) e Niara do Sol cuida da Horta Dja Guata Porã. A Providência Agroecológica é uma Organização voltada à educação ambiental e agroecologia no Morro da Providência (Gamboa, Rio de Janeiro, RJ), a primeira favela do Brasil. O espaço é gerido por Alessandra Roque e Lorena Portela.

8 - Em 2023, a Comissão foi composta por: Andrea Costa (Museu Nacional),  Hilda da Silva Gomes (FioCruz), Isabel Portella (Museu da República), Marcia Moraes (UFF), Sheila Nicolas Villas Boas (Museu Nacional) e Tathianna Prado Dawes (UFF), em conjunto com os educadores do Museu: Bruno Baptista, Eduarda Emerick, Júlia Mayer, Leo Oliveira, a Supervisora de Educação Hérica Lima e a Gerente de Educação Camila Oliveira.

9 - Esses grupos são formados por pessoas em vulnerabilidade social e os encontros têm como objetivo democratizar o acesso a equipamentos culturais e promover um espaço de acolhimento, debates e proposições artísticas que dialoguem com os interesses trazidos pelos participantes.

Sobre a autoria:

qemFAZX.jpeg Júlia Mayer é pós-graduanda em Divulgação Científica pelo IFRJ, licencianda em Ciências Biológicas pela UFRJ e museóloga formada pela UNIRIO, onde foi monitora da disciplina de Museologia e Educação com o projeto "A UNIRIO e a formação em Educação Museal: contribuições para a implementação da PNEM (Política Nacional de Educação Museal)" e estagiária no Laboratório de Tafonomia e Paleoecologia Aplicadas - LABTAPHO, desenvolvendo trabalho e pesquisa com o grupo GeoTales. Atualmente é Educadora Museal no Museu do Amanhã, promovendo e criando experiências e materiais que dialoguem entre diversos conhecimentos de forma acessível. Tem experiência na área de Divulgação Científica, Educação Museal, Educação Museal Online e Acessibilidade Cultural.

3gXV8VF.jpeg Lais Daflon é historiadora da arte, educadora museal, mestra em Artes Visuais, possui MBA em Gestão de Museus e atualmente é Coordenadora de Educação no Museu do Amanhã. Pesquisa sobre metodologias de educação em museus, processos de mediação e relações entre história da arte e turismo cultural. Idealizou o projeto Arte Errante, no qual ministrou três cursos de história da arte e diversas visitas a museus com foco na relação entre a história da arte e a história do Rio de Janeiro. Foi coordenadora de cultura no Pré- vestibular Comunitário Marielle Franco em 2019 e 2020. Atuou como educadora no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro de 2013 a 2023, ocupando o cargo de Coordenadora de Mediação em 2022 e 2023.

aJMsyqH.jpeg Maria Luiza Lopes é mestra em Divulgação da Ciência, Saúde e Tecnologia pela Fiocruz e Licenciada em Ciências Biológicas pela Unirio. Cursou Cinema de Documentário no Cinema Nosso, atuando no setor de Fotografia. Atualmente é Educadora no Museu do Amanhã, realizando pesquisas e práticas com foco nas Geopoéticas. Entre 2015 e 2019 foi integrante da equipe Geotales e no ano de 2022 trabalhou no Planetário do Museu Ciência e Vida.

SgX879z.jpeg Thainá Nunes é bacharel em História da Arte pela Escola de Belas Artes/UFRJ, Tradutora-Intérprete de LIBRAS pelo Colégio Pedro II e Educadora Bilíngue no Museu do Amanhã. Atua como educadora e pesquisadora de Acessibilidade Cultural e Cultura Surda, relacionando educação, saberes artísticos e direito à informação com tradução e interpretação em LIBRAS em equipamentos de arte e cultura do Rio de Janeiro.

gaHRLCx.jpeg Vinicius Valentino é biofísico, graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2022), atua nos campos da Educação Museal e Divulgação Científica desde 2016 , com interesse em públicos neuro diversos e atividades educacionais.

Como citar este artigo: 

MAYER, Júlia; DAFLON Lais; LOPES, Maria Luiza; NUNES, Thainá; VELENTINO, Vinícius. O Programa de Educação do Museu do Amanhã: tecendo futuros e convivências. Notícias, Revista Docência e Cibercultura, maio de 2024, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.

Editores/as Seção Notícias:

Frieda Maria Marti, Felipe CarvalhoEdméa SantosMarcos Vinícius Dias de Menezes e Mariano Pimentel