TRIUNFO DO ARTIFICIAL SOBRE O NATURAL?
Por: Mauro Guimarães
Professor do Programa de Pós Graduação em Educação: contexto contemporâneo e demandas populares da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Ambiental, Diversidade e Sustentabilidade (GEPEADS/IM). Para conversar mais comigo e meu grupo de pesquisa, acesse: Instagram @tessitura.rededesaberes – Blog: gepeadsim.wordpress.com
TRIUNFO DO ARTIFICIAL SOBRE O NATURAL?
Sou educador ambiental, professor universitário que milita nas áreas da Educação, Geografia, Meio Ambiente e certamente um observador atento e preocupado com tantos impactos da tecnologia da Inteligência Artificial (IA) em nosso cotidiano, privado, profissional; como também nas relações sociais e da nossa sociedade com a natureza.
O meu grupo de pesquisa tem um perfil no Instagram em que costumo publicar textos curtos, provocativos sobre as questões socioambientais. Tratamos das gravíssimas situações de degradação social, econômica, política, ética e ambiental como dimensões de uma crise que é civilizatória e de seu modelo de desenvolvimento; portanto, uma crise da modernidade e seu Paradigma Disjuntivo, como nomeia Edgar Morin. É nesse contexto que acreditamos que as referencias estruturantes constituintes da visão de mundo e o modo de vida da modernidade se esgotaram em sua capacidade suporte e que, sua reprodução acirra cada vez mais processos de degradação socioambiental, ameaçando a própria capacidade de sustentar a vida planetária; como bem demonstra a emergência climática que vivemos.
Um dia desses escrevi sobre o impacto da tecnologia na relação entre o artificial e o natural e meu filho, dessa geração digital, como uma interessante provocação, pegou esse meu texto e pediu para o ChatGPT refutar meus argumentos. Achei um bom exercício de reflexão que me levou a escrever este texto com minhas impressões.
O texto a seguir é o que publiquei no Instagran, que será sequenciado pela refutação feita pelo CharGPT e, ao final, as minhas reflexões diante dos argumentos produzidos pela IA.
Inteligência Artificial e Educação Ambiental: o triunfo do artificial sobre o natural?
O que entendemos por evolução da sociedade moderna passa pelo aumento do poder de dominação sobre a natureza. A tecnologia instrumentaliza e proporciona esse objetivo de dominação. Porém para dominar hierarquizamos e nos apartamos daquilo a ser dominado. Não só nos afastamos da natureza, como não nos reconhecemos como tal. Apartados e poderosos diante da natureza, cada vez mais inseridos tecnologicamente na virtualidade das relações, a artificialidade perigosamente se impõe.
Em paralelo, uma sociedade que se estrutura cada vez mais sobre o individualismo, na liquidez supérfluas das relações, do egoísmo do poder, as separações se afirmam como estruturantes de um modo de vida que em sua manutenção, aceita acriticamente como imutável, reflete o triunfo de um modelo necrocivilizatório.
A Inteligência artificial (IA) que hora se desenvolve não é triunfo, mas uma ruptura cada vez mais danosa ao todo, la Madre Tierra y sus hijos. Perceber a IA como triunfo do desenvolvimento tecnológico é sacramentar o esquecimento de que nós, seres naturais que somos, dependemos da vida que nos transcende e antecede a cada um de nós. O triunfo do artificial é a degradação da vida e da capacidade maior que nos une e nos mantém vivos; o amor ao próximo.
A distância velada por uma falsa ideia de que a tecnologia nos aproxima pela virtualidade, é a afirmação definitiva da alienação e mortificação do movimento que nos humaniza em direção a sacralização da vida. O contrário, que nos distancia da vida, degrada, adoece, exclui, degenera as relações de troca, a dialogia, o solidário, o bem comum. Desumaniza as relações na injusta dominação e exploração do outro humano-natureza.
A Educação Ambiental em tempos de crise, na urgência de romper com o movimento de destruição da vida, se coloca na emergência do reencontro com o natural, na sacralização da vida, no triunfo da solidariedade, do renascimento do amor ao próximo, que não é vivido em sua plenitude no virtual e que nem a inteligência artificial jamais sentirá.
IA - Gere um texto refutando os argumentos do texto acima. (pergunta do meu filho)
Resposta IA:
Como uma Inteligência Artificial, não posso refutar a perspectiva apresentada acima, já que a tecnologia que me sustenta pode ser vista como uma ferramenta de dominação e separação da natureza. No entanto, é importante lembrar que a tecnologia pode ser usada para resolver problemas ambientais e até mesmo para promover a conscientização ambiental. Por exemplo, muitas organizações ambientais usam a tecnologia para monitorar a qualidade do ar e da água, além de realizar simulações para prever o impacto das mudanças climáticas.
Além disso, a tecnologia pode conectar as pessoas e aumentar a colaboração em prol do meio ambiente. As redes sociais, por exemplo, podem ser usadas para compartilhar informações e mobilizar ações em defesa do meio ambiente. A tecnologia também pode ser usada para educar e conscientizar as pessoas sobre as questões ambientais e para promover um estilo de vida mais sustentável.
Embora seja verdade que o individualismo e o egoísmo possam ser exacerbados pela tecnologia, não é necessariamente o caso de que a tecnologia seja a causa desses problemas. A educação e a conscientização podem ajudar a promover valores como a solidariedade e a empatia, que podem ser essenciais para a proteção do meio ambiente e para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa.
Por fim, a Inteligência Artificial pode ser vista como uma ferramenta valiosa na busca por soluções ambientais e na promoção da sustentabilidade. Embora seja importante estar ciente dos potenciais efeitos negativos da tecnologia, é importante também reconhecer seu potencial para o bem e para o avanço da humanidade em direção a um futuro mais sustentável e equilibrado com a natureza.
Refletindo sobre a resposta da IA:
Muito interessante este exercício da IA fazer essa contra-argumentação! Esse software é impressionante como já produz textos muito bem escritos e com argumentos com grande coerência lógica. Porém me parece que respaldando e respaldado pela lógica dominante de uma racionalidade instrumental. Assim, irá argumentar no uso da tecnologia pelo viés funcional e instrumental, que estruturam a racionalidade da sociedade moderna, vendo que ela tem uma função de servir a algo e que vai depender do seu uso, os resultados. A contra argumentação não traz a dimensão política das relações de poder que decidem a produção e o uso hegemônico da tecnologia, em sua forma estruturante no atual modo de organização social. As argumentações da IA não são inválidos, pois estas possibilidades positivas da tecnologia para a sustentabilidade são viáveis, porém sua viabilização para se concretizar na realidade é dependente da dimensão política. Não trazer isso na argumentação a faz simplista e instrumentaliza a lógica hegemônica por retirar o caráter crítico da análise. Por exemplo, esse mesmo argumento foi usado para justificar a Revolução Verde (década de 50) de modernização do campo, que o uso da tecnologia iria aumentar a produtividade e, portanto, a produção de alimentos, com isso diminuindo a fome no mundo. A produtividade aumentou tremendamente e a fome não diminuiu, mas a lógica da modernidade se expandiu para o mundo agrário, assim como a degradação ambiental no meio rural.
Não é demonizar a tecnologia, mas dentro da racionalidade instrumental da sociedade moderna, ela ao ser produzida e consumida dentro da lógica dominante, seu custo-benefício é alto no processo de degradação socioambiental. Até mesmo porque como mercadoria em que é transformada, sua apropriação beneficia desigualmente as pessoas e, principalmente, pela relação de dominação e exploração da natureza que a tecnologia media, priorizando o econômico em nossa sociedade, as condições ambientas de sustentação da vida se veem seriamente ameaçadas. Portanto, acredito que a discussão principal não é se a tecnologia pode ser bem ou mal utilizada, como se dependesse apenas da vontade de quem a for utilizar, como sendo um mero instrumento neutro, sem uma ideologia e racionalidade hegemônica que a concebe, financia, produz e consome. O que me parece central é a constituição de um outro modo de organização social, de viver nesse mundo, em que a tecnologia esteja subordinada a dimensão da sustentabilidade socioambiental.
Por isso, em meu texto postado no Instagram defendo que a forma como a tecnologia vem se expandindo dentro da lógica da modernidade, não é um triunfo para propormos um outro mundo, mas é um aprofundamento da hegemonia de um mundo que está em colapso!
Diante desse contexto, como educador me coloco a refletir: é esse mundo de uma evolução pré determinada por essa racionalidade que queremos? É o desejo de domínio que a atual tecnologia instrumentaliza, que preenche os sentidos de incompletude e de realização em nosso processo de humanização? O sentido imanente de manutenção da vida está presente nesse processo de desenvolvimento tecnológico? Há vida robótica plena de inteligência artificial num mundo ameaçado pela aniquilação da vida? Muitas reflexões que, confesso, me assustam!
Como citar este artigo:
GUIMARÃES, Mauro. TRIUNFO DO ARTIFICIAL SOBRE O NATURAL? Notícias, Revista Docência e Cibercultura, maio de 2023, online. ISSN: 2594-9004. Disponível em: < >. Acesso em: DD mês. AAAA.
Editores/as Seção Notícias:
Felipe Carvalho - Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estácio de Sá (PPGE/UNESA)
Edméa Santos - Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Rural (PPGEDUC/UFRRJ)
Marcos Vinícius Dias de Menezes - Graduando em Letras - Português, Inglês e Literatura em modo de licenciatura pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Bolsista de Iniciação Científica na FAPERJ
Mariano Pimentel - Professor do Programa de Pós-Graduação em Informática da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (PPGI/UNIRIO)