A construção de um discurso jurídico sobre o aborto
Análise das audiências públicas no Supremo Tribunal Federal
DOI:
https://doi.org/10.12957/rfd.2025.95219Palavras-chave:
Aborto, Audiências Públicas, Supremo Tribunal FederalResumo
O aborto apresenta-se no debate social como um tema de oposições radicais, que não comporta posições intermediárias. No mundo inteiro, o aborto divide opiniões na sociedade, na política e no Direito. E é justamente essa polarização que bloqueia as vias política e legislativa para a ação dos ativistas pró e contra o aborto, compelindo-os a recorrer ao Judiciário, especialmente às cortes constitucionais. A judicialização da questão do aborto tem se mostrado mais efetiva, como ocorreu no julgamento pelo STF das ADPF n° 442 e 54, além da ADI n° 5581, através dos quais a Corte promoveu a única alteração significativa na regulação do tema em toda a América Latina até a presente data. O objetivo deste trabalho consiste em demonstrar, a partir da análise dos argumentos favoráveis e contrários ao aborto utilizados no debate sobre o tema no âmbito das audiências públicas, como a polarização política estrutura o campo discursivo em torno do aborto. A partir dos conceitos da Teoria da Argumentação, foi possível demonstrar que os argumentos utilizados no debate judicial foram essencialmente “de justificação externa”, divididos entre a) enunciados jurídicos; b) enunciados empíricos e c) enunciados argumentativos. A conclusão é de que o discurso em torno de “casos difíceis” e de temas limítrofes e socialmente polarizados como o aborto não alcança fundamentação suficiente apenas através dos cânones do Direito Positivo, exigindo o concurso de outras formas de justificação que são de natureza político-ideológica
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