Educação Jurídica e Relações Étnico-Raciais (Vol. 17, n.4, 2026)

2025-11-03

Historicamente, a Educação Jurídica se relacionou intimamente com a produção e circulação de discursos sobre raça no Brasil. Entretanto, tal constatação não decorreu da crítica predominante à Educação Jurídica. Ainda que evidenciassem o caráter bacharelesco e o cenário de crise e massificação dos cursos jurídicos, demorou para que as reflexões sobre a Educação Jurídica se dedicassem a desencobrir os silêncios epistêmicos, exclusões e práticas racistas que estruturam a cultura jurídica e o cotidiano das faculdades de Direito. Na verdade, foi preciso que enfrentamentos político-acadêmicos alterassem o contexto histórico e que a pergunta crítica sobre a raça fosse feita à educação em Direito e a juristas que se ocupassem de pensá-la.

A mudança de contexto não foi abstrata. Consistiu em resultado do que a pesquisadora Nilma Lino Gomes chamou de “movimento negro educador”, o qual luta pelo direito à Educação e ao mesmo tempo educa instituições e a sociedade brasileira. A conquista das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que tornaram obrigatório o ensino de história e cultura indígena e afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, tanto públicos quanto privados, também impactou direta e indiretamente as universidades, através da Resolução CNE nº 05/2018, ao exporem ausências e ampliarem a circulação de saberes até então silenciados.

Entretanto, é com o que Yuri Santos de Brito chamou de “A batalha das cotas” que foi possível que sujeitos historicamente excluídos de imagens de intelectualidade e espaços de poder, como universidades e Faculdades de Direito, pudessem acessar estes espaços oferecendo diferentes perguntas, repertórios e resistências. Além disso, as ações afirmativas expuseram a branquitude, a racialidade que preenche a Educação Jurídica, de modo pretensamente neutro, enquanto não-existência racial. No campo do Direito, antes mesmo das ações afirmativas, a presença de intelectuais negras e negros foi importante para constituir um fluxo de estudos e práticas antirracistas, com contextos e trajetórias singulares, mas reunidos no campo de “Direito e Relações Raciais”, como Dora Lúcia Lima Bertúlio (in memoriam) intitulou sua obra fundacional.

Diante deste contexto, conscientes de que o enfrentamento ao racismo na Educação Jurídica demanda aprofundamento e ampliação de debates, considerando experiências e desafios comuns a grupos e comunidades racializadas, como povos indígenas, comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais, o presente dossiê busca se somar a tais esforços críticos no campo da Educação Jurídica e das Relações Étnico-Raciais.

Nesse sentido, destacamos que são pressupostos político-editoriais do dossiê selecionar predominantemente textos de autorias não-brancas e buscar a diversidade regional.

Serão bem-vindas propostas de artigos que dialoguem com a provocação geral do dossiê, e especialmente aquelas que se proponham a refletir sobre “Educação Jurídica e Relações Étnico-Raciais” com ênfase nas seguintes dimensões:

  • Articulação entre Educação Jurídica e Relações Etnico-Raciais nas práticas de ensino, pesquisa e extensão na graduação, na pós-graduação, em cursinhos preparatórios e espaços de formação profissional: experiências; contexto de reformas institucionais/curriculares; espaços de produção de novos saberes, etc.
  • Educação Jurídica e Ações Afirmativas: reflexões sobre acesso, permanência, enfrentamentos epistêmicos, práticas pedagógicas e egressos.
  • Educação Jurídica, Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e diferentes Comunidades Tradicionais: acesso, diálogos de saberes, enfrentamento à violência epistêmica, intelectuais e autorias indígenas e quilombolas na Educação Jurídica e outros desafios e potencialidades.
  • Educação Jurídica, Relações Étnico-Raciais e Docência: práticas pedagógicas, formação docente, cotidiano institucional, concursos para Magistério Superior e ações afirmativas, etc.
  • Educação Jurídica, Branquitude e Relações de Poder: eurocentrismo, epistemicídio, ignorância branca, patrimonialismo e pacto narcísico da branquitude no cotidiano das faculdades de Direito e de outras instituições de educação jurídica formal.
  • Educação Jurídica, Relações Étnico-Raciais e Gênero: experiências docentes e discentes; a presença de mulheres racializadas nas faculdades de Direito; a presença de intelectuais negras nos currículos, planos de ensino e programas de pós-graduação.
  • Educação Jurídica, Relações Étnico-Raciais e Produção do Conhecimento: livros didáticos, mercado editorial, eventos científicos, enfrentamentos teóricos-metodológicos, pluralismo epistêmico e grafias indisciplinares.

As propostas de resumo devem ser enviadas para o formulário https://forms.gle/LTCtphHyM74rud3E6 (o qual deve ser lido com atenção), até o dia 15 de novembro de 2025 no formato abaixo especificado.

O cronograma de publicação do Dossiê se encontra ao final desta chamada. Dúvidas deverão ser encaminhadas para o email dossieeducacaojuridica@gmail.com.

As propostas devem conter:

  • Título: subtítulo
  • Nome, e-mail, qualificação, vínculos institucionais das pessoas autoras, e-mail(s) e ORCID(s). Todos estes dados devem ser preenchidos apenas no formulário. As propostas de resumo não devem ser identificadas.
  • Um arquivo único em .pdf com, no máximo, 1.500 palavras, contendo: (i) resumo, indicando de forma nítida a pergunta orientadora do trabalho, as abordagens metodológicas que serão utilizadas para o desenvolvimento do texto, as conclusões esperadas e a contribuição da pesquisa para o campo e (ii) uma estrutura provisória de tópicos do texto, incluindo lista de eventuais casos, ideias e conceitos-chave, experiências ou propostas teóricas que serão analisados. A contagem de palavras não inclui referências.

Serão aceitas propostas com, no máximo, 3 pessoas autoras. O recebimento de propostas é restrito a apenas uma proposta por pessoa autora (ainda que na condição de coautoria). A Revista Direito e Práxis não publica artigos escritos exclusivamente por pessoas que estejam cursando graduação ou Mestrado.

Cronograma

16/11/2025 — Prazo para as pessoas autoras enviarem as propostas de artigo.

11/01/2026 — Prazo para as organizadoras comunicarem as decisões sobre as propostas recebidas.

29/03/2026 — Prazo para as pessoas autoras enviarem o artigo completo.

14/06/2026 — Prazo para as organizadoras retornarem os textos às pessoas autoras com comentários/sugestões.

16/08/2026 — Prazo para envio da versão final dos artigos após comentários/sugestões.

03/12/2026 — Publicação do dossiê!