O criminoso que denuncia a si mesmo

Nietzsche e a justiça restaurativa

Autores

DOI:

https://doi.org/10.12957/rqi.2024.74126

Palavras-chave:

Direito, Nietzsche, justiça restaurativa, crime, punição

Resumo

Este trabalho propõe uma discussão sobre a crítica de Nietzsche às instituições criminais. O tema é abordado a partir de uma passagem colhida do livro “Aurora” sobre uma conjectura na qual um criminoso denunciaria a si mesmo. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é compreender se a subversão do conceito tradicional de justiça criminal, realizada por Nietzsche ao propugnar que a pena deve servir também como uma honra ao transgressor, pode ser relacionada às propostas da justiça restaurativa. O problema da pesquisa é verificar se há uma compatibilidade teórica entre a filosofia nietzschiana e os fundamentos da justiça restaurativa. Como método de abordagem, parte-se da interpretação conceitual dos textos do filósofo e de sua comparação analítica com as principais teses sustentadas pelo movimento da justiça restaurativa. A partir dessas premissas, discute-se a possibilidade de se visualizar no filósofo uma antecipação teórica de algumas ideias fundamentais da justiça restaurativa, como a ênfase na reparação do dano ao invés da punição. O estudo conclui que as visões de Nietzsche e da justiça restaurativa não são plenamente conciliáveis.

Biografia do Autor

Vinicius Fernandes Ormelesi, Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG)

Doutor (2019) em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela USP. Mestre (2013) e graduado (2010) em Direito pela UNESP. Especialista em Docência do Ensino Superior. Membro da Associação Brasileira de Filosofia do Direito e Sociologia do Direito (ABRAFI). Professor adjunto da Universidade do Estado de Minas Gerais, unidade Frutal e professor da Faculdade de Educação São Luis de Jaboticabal. Líder do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Direito, Estado e Modernidade (NEDEM).

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Publicado

2024-12-31

Como Citar

Ormelesi, V. F. (2024). O criminoso que denuncia a si mesmo : Nietzsche e a justiça restaurativa . REVISTA QUAESTIO IURIS, 17(1), 220–241. https://doi.org/10.12957/rqi.2024.74126