O criminoso que denuncia a si mesmo
Nietzsche e a justiça restaurativa
DOI:
https://doi.org/10.12957/rqi.2024.74126Palavras-chave:
Direito, Nietzsche, justiça restaurativa, crime, puniçãoResumo
Este trabalho propõe uma discussão sobre a crítica de Nietzsche às instituições criminais. O tema é abordado a partir de uma passagem colhida do livro “Aurora” sobre uma conjectura na qual um criminoso denunciaria a si mesmo. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é compreender se a subversão do conceito tradicional de justiça criminal, realizada por Nietzsche ao propugnar que a pena deve servir também como uma honra ao transgressor, pode ser relacionada às propostas da justiça restaurativa. O problema da pesquisa é verificar se há uma compatibilidade teórica entre a filosofia nietzschiana e os fundamentos da justiça restaurativa. Como método de abordagem, parte-se da interpretação conceitual dos textos do filósofo e de sua comparação analítica com as principais teses sustentadas pelo movimento da justiça restaurativa. A partir dessas premissas, discute-se a possibilidade de se visualizar no filósofo uma antecipação teórica de algumas ideias fundamentais da justiça restaurativa, como a ênfase na reparação do dano ao invés da punição. O estudo conclui que as visões de Nietzsche e da justiça restaurativa não são plenamente conciliáveis.
Referências
BAMFORD, Rebecca. Nietzsche and ubuntu. South African Journal of Philosophy, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 85-97, 2007.
BENOIT, Blaise. Nietzsche: da crítica da lógica do direito penal ao problema da concepção de um novo direito penal?. Revista Dissertatio de Filosofia, Pelotas, v. 38, p. 11-36, 2013.
BRAITHWAITE, John. Restorative justice: Assessing optimistic and pessimistic accounts. Crime and justice, Chicago, v. 25, p. 1-127, 1999.
CARDOSO, Alianna Caroline Sousa; GIANEZINI, Kelly. Direito, moral e religião: uma análise da justiça, do castigo e da vingança em Nietzsche. In: GIANEZINI, Kelly; GROSS, Jacson (Org.). Estudos contemporâneos em ciências jurídicas e sociais. Florianópolis: Dois Por Quatro; Criciúma, SC: UNESC, 2017. p. 149-180.
CARVALHO, Salo de. Memória e esquecimento nas práticas punitivas. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, PUCRS, Edição Especial, n. 2, p. 61-85, 2006.
CONWAY, Daniel. Nietzsche’s On the genealogy of morals. A reader’s guide. New York: Continuum, 2008.
FATTAH, Ezzat A. From philosophical abstraction to restorative action, from senseless retribution to meaningful restitution: just deserts and restorative justice revisited. In: WEITEKAMP, Elmar G. M.; KERNER, Hans-Jürgen. Restorative Justice: theoretical foundations. Cullompton: Willan, 2002, p. 308-321.
GEMES, Ken. Postmodernism's Use and Abuse of Nietzsche. Philosophy and Phenomenological Research, Providence, v. 62, n. 2, p. 337-360, March 2001.
GERHARDT, Volker. Das „Princip des Gleichgewichts“. Zum Verhältnis von Recht und Macht bei Nietzsche. Nietzsche-Studien, Berlin, v. 12, p. 111-133, 1983.
GIACOIA JÚNIOR, Oswaldo. Nietzsche e a genealogia do direito. In: FONSECA, Ricardo Marcelo (org.). Crítica da modernidade: diálogos com o direito. Florianópolis: Boiteux, 2005.
GONÇALVES, Luiz Felipe Xavier. Filosofia do direito em perspectiva genealógica. Cadernos Nietzsche, Porto Seguro, v. 41, n. 3, p. 166-191, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2316-82422020v4103lfxg Acesso em: 12 mar. 2023
HANSHE, Rainer J. Nietzsche’s library. 2007. Disponível em: http://www.nietzschecircle.com/Pdf/NIETZSCHE_S_LIBRARY.pdf Acesso em: 13 mar. 2023
HELLER, Agnes. Por una filosofía radical. Traducción de J. Francisco Ivars. Barcelona: Ediciones 2001, 1980.
HORN, Geraldo Balduíno; MENDES, Ademir Aparecido Pinhelli. Ensino de Filosofia: método e recepção filosófica em Agnes Heller. Educar em Revista, n. 62, p. 279–293, out./dez. 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0104-4060.44746 Acesso em 12 mar. 2023.
LEITER, Brian. The hermeneutics of suspicion: recovering Marx, Nietzsche, and Freud. In: LEITER, Brian. (ed.). The future of philosophy. Oxford: Clarendon Press, 2004, p. 74-105.
MACKAY, Robert E. Punishment, guilt, and spirit in restorative justice: an essay in legal and religious anthropology. In: WEITEKAMP, Elmar G. M.; KERNER, Hans-Jürgen. Restorative Justice: theoretical foundations. Cullompton: Willan, 2002, p. 247-266.
MARTON, Scarlett. Nietzsche, filósofo da suspeita. Rio de Janeiro: Casa da Palavra; São Paulo: Casa do Saber, 2010.
______. O Nascimento da Tragédia: da superação dos opostos à filosofia dos antagonismos. In: MARTON, Scarlett. Nietzsche e a arte de decifrar enigmas – treze conferências europeias. São Paulo: Loyola, 2014.
MELO, Eduardo Rezende de. Justiça restaurativa e seus desafios histórico-culturais: um ensaio crítico sobre os fundamentos ético-filosóficos da justiça restaurativa em contraposição à justiça retributiva. In: SLAKMON, C.; DE VITTO, R.; PINTO, R. G. (orgs). Justiça Restaurativa. Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, 2005, p. 53-78.
______. Nietzsche e a justiça. São Paulo: Perspectiva, 2010.
MENKEL-MEADOW, Carrie. Restorative Justice: what is it and does it work? Annual Review of Law and Social Science, [S. l.], v. 3, p. 161-187, 2007. Disponível em: https://www.annualreviews.org/doi/abs/10.1146/annurev.lawsocsci.2.081805.110005 Acesso em: 23 fev. 2023.
MIGUEL, Luis Felipe. A democracia domesticada: bases antidemocráticas do pensamento democrático contemporâneo. DADOS – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 45, n. 3, p. 483-511, 2002.
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Um livro para todos e para ninguém. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
______. Aurora. Reflexões sobre os preconceitos morais. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
______. Genealogia da moral. Uma polêmica. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
______. O Anticristo. Maldição ao cristianismo. Ditirambos de Dionísio. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
______. Obras Incompletas. Tradução e notas de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Nova Cultural, 1999.
______. Werke. Kritische Gesamtausgabe. Organizada por Giorgio Colli e Mazzino Montinari. 30 volumes. Berlim: Walter de Gruyter & Co., 1967/1978. Disponível em: http://www.nietzschesource.org Acesso em: 12 mar. 2023
NOBRE, Renato F. Nietzsche e a escrita artística do pensamento. Trans/Form/Ação, Marília, v. 41, n.3, p. 57-78, jul./set. 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0101-3173.2018.v41n3.04.p57 Acesso em: 10 mar. 2023
OLIVEIRA, Leonardo Camacho de. Uma genealogia do direito penal: contribuições nietzschianas para se pensar uma justiça punitiva para além da moral do ressentimento. Estudos Nietzsche, v. 6, n. 2, p. 281-298, jul./dez. 2015.
ORMELESI, Vinicius Fernandes. O direito como luta contra o ressentimento: reflexões sobre direito e justiça a partir da filosofia nietzschiana. 2019. 246 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2019.
PASCHOAL, Antonio Edmilson. As formas de ressentimento na filosofia de Nietzsche. Philósophos, Goiânia, v. 13, n. 1, p. 11-33, jan./jun. 2008.
______. Contribuições para um debate sobre a justiça a partir da filosofia de Friedrich Nietzsche. Philósophos, Goiânia, v. 18, n. 2, p. 43-59, jul./dez. 2013.
______. Nietzsche e Dühring: ressentimento, vingança e justiça. Revista Dissertatio de Filosofia, Pelotas, v. 33, p. 147-172, inverno de 2011.
PAULO, Alexandre R. de; SILVA, Valline C. A implementação dos postulados da justiça restaurativa no âmbito criminal brasileiro. Seqüência - Estudos Jurídicos e Políticos, [S. l.], v. 42, n. 89, p. 1–26, 2022. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/77354 Acesso em: 4 mar. 2023.
PRANIS, Kay. Processos Circulares: teoria e prática. Tradução de Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athenas, 2010.
RISSE, Mathias. Origins of Ressentiment and sources of normativity. Nietzsche-Studien, Berlin, v. 32, p. 142-170, 2003.
SALANSKIS, Emmanuel. Justiça. In: GRUPO DE ESTUDOS NIETZSCHE. Dicionário Nietzsche. São Paulo: Loyola, 2016, p. 280-282.
SALM, Joao; LEAL, Jackson da Silva. A Justiça Restaurativa: multidimensionalidade humana e seu convidado de honra. Seqüência - Estudos Jurídicos e Políticos, [S. l.], v. 33, n. 64, p. 195–226, 2012. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/2177-7055.2012v33n64p195 Acesso em: 4 mar. 2023.
SECCO, Márcio; LIMA, Patrícia Elivânia de. Justiça restaurativa – problemas e perspectivas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 443-46, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2179-8966/2018/32715. Acesso em: 24 nov. 2021.
SERRANO MORÁN, José Antonio; RIVAS SANDOVAL, Francisco Javier. La justicia restaurativa como ideología de administración de justicia en la Constitución federal. El Cotidiano, México, n. 197, p. 49-56, 2016. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/325/32545857007.pdf Acesso em: 09 mar. 2023
SMILGYS, Thaís Helena. Matriz devedor-credor e a formação do sujeito de direito: da troca primal ao mercado. 2018. 227 f. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2018.
VAN NESS, Daniel; STRONG, Karen Heetderks. Restoring justice: An introduction to restorative justice. London: Routledge, 2014.
WOTLING, Patrick. Nietzsche e o problema da civilização. Trad. Vinicius de Andrade. São Paulo: Barcarola, 2013.
ZAMBAM, Neuro José; ICKERT, Airton Juarez. A democracia brasileira e a pena privativa de liberdade: alternativas que preservam a dignidade humana. Revista Brasileira de Direito, Passo Fundo, v. 7, n. 2, p. 147-166, out. 2011. Disponível em: https://seer.atitus.edu.br/index.php/revistadedireito/article/view/271/221. Acesso em: 27 fev. 2023.
ZEHR, Howard. Changing lenses: a new focus for crime and justice. Scottdale: Herald Press, 1990.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Os Direitos autorais patrimoniais dos artigos publicados pertencem à Revista Quaestio Iuris. A reprodução total dos artigos desta revista em outras publicações, ou para qualquer outra utilidade, é permitida a todos, para que distribuam, remixem, adaptem e criem a partir do trabalho aqui publicado, mesmo para fins comerciais, desde que atribuam o devido crédito pela criação original ao autor e o crédito à Revista Quaestio Iuris pela primeira publicação do trabalho. A Revista Quaestio Iuris obedece aos termos da licença Creative Commons de Atribuição 4.0 Internacional CC-BY (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0), em consonância com a legislação autoral brasileira, Lei 9.610/1998.
The patrimonial copyrights of the published articles belong to the Quaestio Iuris Law Review. The total reproduction of the articles of this review in other publications, or for any other use, is allowed to all, to distribute, remix, adapt and create from the work published here, even for commercial purposes, as long as they give due credit for the original creation to the author and credit to Quaestio Iuris Lae Review for the first publication of the work. The Quaestio Iuris Law Review complies with the terms of the Creative Commons Attribution 4.0 International CC-BY license (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0), in accordance with brazilian copyright law, Law 9.610/1998.