Circuito audiovisual implicado:
apoio do empresariado à ditadura brasileira a partir de um documentário nos 150 anos da Independência (1972)
DOI:
https://doi.org/10.12957/revmar.2024.84381Palavras-chave:
Audiovisual, Ditadura, Propaganda, Sesquicentenário, IndependênciaResumo
O audiovisual também foi meio do apoio do empresariado à ditadura brasileira. O artigo faz um estudo de caso de A terra de todos nós (Thomas Somlo, 1972, 30 min, color.), documentário institucional de média-metragem financiado pela indústria tabagista Souza Cruz em homenagem aos 150 anos da Independência do Brasil (1972). A análise desenvolve a hipótese da formação de um circuito audiovisual implicado na sustentação simbólica do regime na virada dos anos 1960 para os 1970. O método vem da área história e audiovisual, integrando a análise fílmica atenta ao levantamento de fontes extrafílmicas que permitem uma reconstituição da trajetória de produção e circulação do artefato audiovisual. A argumentação passa pelo relato do resgate de rolos com fragmentos do documentário no arquivo; pela forma de representação a-histórica do berço esplêndido “modernizado”; pelo patrocínio da Souza Cruz e o audiovisual no varejo da produtora Filmotec; e pela circulação do filme de exportação na escala nacional e internacional, na interface com a diplomacia cultural governamental. Conclui-se que A terra de todos nós, sendo de iniciativa privada, também se situa entre a propaganda oficial e o adesismo civil.
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