EDITORIAL

Diferentes campos de estudos e de práticas sociais voltadas à infância - a ciência, a política, as legislações, a educação formal, os espaços culturais, a mídia etc. - vêm contribuindo para a construção de um novo olhar às crianças. Por um lado, testemunhamos a conquista da sua condição como sujeitos de direitos. Por outro lado, vemos o quanto as constantes lutas e conquistas legais nos falam de uma infância à margem desses direitos.

Numa sociedade onde a idéia de justiça está mais próxima do Código de Defesa do Consumidor do que, propriamente, do Código Civil, os direitos da criança parecem se fazer mais visíveis no reconhecimento da sua condição de consumidora, que como tal, opina, decide e movimenta o mercado. Enquanto isso, instituições modernas como a escola e a família, fundadoras da concepção ainda hegemônica de infância, encontram-se em crise, como também a própria acepção moderna de infância. Ainda assim, o direito da criança à escola é uma luta contemporânea, intermitente, a avisar que as promessas modernas não foram de todo cumpridas. Entre o infans desautorizado e sem voz, e a criança prodígio que se auto-constrói, a infância permanece em questão.

Teias, em seus números 11 e 12, traz para o debate as relações entre infância, cultura e escolarização. Compondo a seção Em Pauta, duas perspectivas de visada contemporâneas da temática da infância: Angela Borba, em seu texto "Infância e cultura nos tempos contemporâneos: um contexto de múltiplas relações", tece considerações acerca da infância na contemporaneidade, apresentadas a partir da ótica dos adultos, mais especificamente, da produção acadêmica em face da cultura midiática. Em diálogo, Gilka Girardello, com o texto "Produção cultural infantil diante da tela: da TV à internet ", realimenta com as vozes infantis a temática da seção.

Nos Artigos, o foco volta-se para a educação das crianças, a formação de seus educadores e, ainda, a complexidade da educação familiar cotidiana. Aristeo Leite Filho tece um balanço das transformações legais e pedagógicas nesse campo em "Rumos da educação infantil no Brasil". Nilva Bonetti, com o texto "Constituir-se professora de educação infantil - caminhos e descaminhos", lança um olhar histórico para a constituição da profissão docente e para a visão que esses docentes vão constituindo de si mesmos. Lígia Aquino tece uma abordagem da educação infantil a partir dos estudos sobre o saber docente, problematizando a importância destes nas propostas de educação continuada. Voltando o olhar para as crianças, Maria Inês Barreto faz um estudo acerca da produção da linguagem infantil a partir de uma proposta de ensino de ciências no contexto pré-escolar em seu texto "Pensando com ciência na Pré-escola: a praxis pela criação de significados". Raquel Gonçalves Salgado traz para o debate a polêmica sobre a institucionalização da infância no texto "Entre as amarras institucionais e a liberdade: as escritas de meninos de um internato", buscando dar ao leitor um modo ver essas crianças a partir do que elas contam de si através de suas escritas. Andréa Reis, com o texto "Imagens históricas da infância refletidas nos contos populares", mergulha na tradição dos contos populares para problematizar concepções e ensinamentos que, historicamente, tem ajudado a constituir o imaginário infantil. Fechando a seção, Núbia de Oliveira Santos, com o texto "O Consumo nas práticas culturais infantis: crianças e adultos no contexto de uma escola pública" lembra-nos que o tema da infância se constitui numa relação alteritária com o mundo do adulto, diálogo de fundamental importância a ser considerado no contexto das práticas educativas e na pesquisa acerca da infância.

O Fórum Permanente de Educação Infantil do Estado do Rio de Janeiro será o foco da entrevista que Maria Fernanda Rezende Nunes concede à Rita Marisa Ribes Pereira.

Na seção Elos, Zoia Prestes apresenta a tradução, diretamente do russo, de dois textos de Vigotski inéditos no Brasil: "Sobre a questão da dinâmica do caráter infantil" e "Sobre a questão do multilingüismo na infância". Nos Ensaios, duas abordagens sobre formação estética e sua importância na educação das crianças: Maria Isabel Leite apresenta o texto "Livro de arte para crianças: um desafio na apropriação de imagens e ampliação de olhares". Dando continuidade, Maria Teresa Jaguaribe Alencar de Moura apresenta a relação entre "Escola e museu de arte: uma parceria possível para a formação artística e cultural das crianças".

Finalizando, três Resenhas convidam a continuar a leitura acerca dos temas postos em debate nestes números de Teias : "A infância entre extremos", de Daniel Lemos e Inára Garcia, "Infância: um conceito em crise?", de Beatriz Fabiana Olarieta, e "Reflexões sobre o respeito: contribuições para a pesquisa com crianças", de Flávia Motta.

Parte da composição destes números foi organizada pela Comissão Editorial responsável pela edição impressa de Teias, professores Donaldo Bello de Souza, Lia faria e Rita Marisa Ribes Pereira. Seu formato digital exigiu expansão e novo tratamento.

 

Rita Marisa Ribes Pereira