GESTÃO DO DESENVOLVIMENTO

UMA ABORDAGEM DO ASSOCIATIVISMO :

O ESTUDO DE CASO DA RANICULTURA EM GUARATIBA/RJ

 

Elaine Cavalcante Peixoto Borin
Doutora em Planejamento Urbano e Regional/ UERJ.

Frederico Guilherme Ferreira Lima
 Mestre em Desenvolvimento Local.


Resumo: O objetivo deste trabalho foi verificar a existência de associativismo entre os ranicultores da região de Guaratiba/RJ. Para isso foi necessário contextualizar desenvolvimento local e associativismo, apresentar as características de uma comunidade local associativista, levantar a pertinência dessas características comuns inerentes aos ranicultores da região de Guaratiba, e emprender esforços para um modelo de associativismo para a ranicultura da região a partir das referências teóricas e da pesquisa de campo.

Palavras chaves: desenvolvimento local; associativismo; ranicultura

AN APPROACH OF ASSOCIATIONS:
THE CASE STUDY IN THE RANICULTURE - GUARATIBA/RJ

Abstract: The goal of this work was to verify the existence of associativism between the frog breeders region Guaratiba/RJ. This required contextualize and local development associativist, have the characteristics of a local community associative, raise the relevance of these common characteristics inherent to the region Guaratiba frog breeders and wage efforts towards a model of frog culture associativism to the region from the references theoretical and field research.
Keywords: local development; associativism; frog culture

Introdução

Este trabalho tem como objetivo geral a verificação da existência de associativismo entre os ranicultores de Guaratiba, região oeste da cidade do Rio de Janeiro. Os objetivos específicos foram: contextualizar desenvolvimento local e associativismo, apresentar as características de uma comunidade local associativista e levantar a pertinência dessas características comuns inerentes aos ranicultores da região de Guaratiba.

Tem-se ao longo do tempo uma série de estudos e pesquisas de valores estratégicos, humanos, sociológicos, geográficos, na maioria de cunho teórico, sobre concentração espacial de atividades produtivas (LIMA, 2008). Para o pleno desenvolvimento deste tipo de organização é necessário resposta mais objetiva com ações estratégicas bem planejadas, como exemplo a formação de um aglomerado de empresas por meio do associativismo.

A fundamentação teórica esteve baseada na perspectiva de desenvolvimento local, o que não foi confirmado pela fragilidade da atividade produtiva tanto na criação quanto na comercialização da carne de rã e derivados, bem como nas características para formação do associativismo.


 Fundamentos teóricos
A partir da década de 80 alguns novos contextos foram introduzidos para o conceito de desenvolvimento, entre estes, destaca-se o desenvolvimento local em conformidade com outras formas de intervenção social. Tem sua vitalidade na autonomia econômica em sociedades não industrializadas com base nas pessoas valorizando o social, sendo verificadas em espaços locais para desenvolvimento (comunidades locais) com participação e implicação dos indivíduos.

O surgimento do conceito de desenvolvimento local apresenta uma dupla perspectiva: a primeira como sustentabilidade do desenvolvimento, a segunda como recurso advindo deste tendo como consequência o aumento da qualidade de vida das comunidades locais (PETITINGA, 2008).

O processo de desenvolvimento local torna-se um diálogo constante entre a comunidade local, as organizações governamentais, as empresas e universidades como unidades de capacitação.

Em discurso quase unânime, o desenvolvimento local não está ligado somente ao crescimento econômico, mas também com a melhoria da qualidade de vida de uma região e com a conservação do meio ambiente sendo este fator inter-relacionado e interdependente.

Todo aspecto do desenvolvimento local perpassa pelas comunidades locais que precisam estabelecer relações de confiança em prol dos objetivos comuns. Estas relações pressupõem aspectos de inter-relação entre as pessoas, daí a necessidade de se tratar o associativismo como objeto para o desenvolvimento local. O poder do associativismo vem sendo resgatado através das relações econômicas da ação coletiva formando a solidariedade social, o que durante o estudo destaca-se como capital social (PINTO, 2006).

A ideia do trabalho associado ou cooperativo é uma forma de solução de problemas eminentes em grupos de pessoas desempregadas ou com posição assalariada em declínio.

Tais situações seriam decorrentes de uma desregulamentação financeira sendo uma grande realidade das novas práticas usuais de transferência informal de tecnologia através de consultorias, colaboração em pesquisas conjuntas entre pesquisadores da universidade, indústria e outras instituições.

Em consequência pode-se experimentar uma retração da base contributiva por parte do Estado e ainda o crescimento da demanda social, que em alguns casos pode ser visto como causa do crescimento de políticas de cunho assistencialista. Aparece, neste momento, uma grande quantidade de formas não assalariadas de trabalho como conta-própria, cooperativa, familiar, empreendedora (PINTO, 2006).

Uma empresa com perfil associativista compartilha informações e ideias, possui gestão transparente, busca resultados de longo prazo, toma decisões colegiadas e vê no concorrente ou fornecedor um aliado com quem pode aprender e crescer.

O estudo de caso
A formação de concentração espacial para atividades produtoras correlatas depende de uma série de características como: empreendedorismo, cultura e valores locais, acesso a serviço financeiro entre outros, porém a governança é entendida como fator que agrega valores facilitando a pertinência de tais características para o crescimento econômico e social de determinada região, neste caso percebe-se na região de Guaratiba através de uma atividade produtora um cenário favorável a determinadas investigações.

Os estudos do Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas - SEBRAE (2003) determinam grandes dificuldades na região de Guaratiba no Rio de Janeiro, para criação de associações entre os ranicultores, o que fomenta a verificação dos fatores incisivos para sustentabilidade da atividade produtora na região, que foi objeto do presente estudo, que foi tratado de forma a conhecer os criadores de “rãs-touro” na região, seus problemas e verificação de ações empreendedoras com inovações tecnológicas, custos e pressupostos de conhecimentos na área da ranicultura.

Este trabalho analisou o papel do elemento associativista nesta região como à alavanca para formação de aglomerado com poder produtivo de desenvolvimento local. 


A área geográfica de Guaratiba determina facilidade de escoamento da produção devido à proximidade dos grandes centros, com clima favorável ao desenvolvimento da ranicultura.


Segundo os dados do Instituto Pereira Passos – IPP, com base no censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE (2000), o bairro dispõe de 13.950,12 ha, com um contingente populacional de 87.132 moradores, num total de 25.440 domicílios. É uma região de baixa densidade demográfica, por conta de uma grande área verde, consequentemente com características rurais onde predispõe culturas regionais fortes com possibilidades de exploração de novos recursos econômicos. 


Ainda de acordo com o Instituto Pereira Passos (IPP), a base salarial referente às famílias moradoras da região é relativamente baixa o que contribui para empreendimentos associativos para geração de renda local.          

                                                                                                                                                         
A região de Guaratiba apresenta baixo Índice de Desenvolvimento Humano - IDH sendo um dos menores da cidade do Rio de Janeiro, de acordo com o IBGE, superada negativamente apenas por grandes favelas como Rocinha, Complexo da Maré, Jacarezinho e Complexo do Alemão e mostra ainda um grupo de pessoas voltadas para a mesma área de produção, a Ranicultura, desta forma o estudo de características associativas na região passou a ser uma oportunidade de diagnóstico para melhoria da qualidade de vida na região através de resultados diretos para a atividade econômica presente no contexto local.


O estudo de caso esteve conectado a interesses do grupo específico formado por ranicultores da região de Guaratiba numa amostra de cinco ranicultores da região de Guaratiba que contava, segundo a RASS - Ranicultores Associados do Estado do Rio de Janeiro, com oito ranicultores quando da sua criação com os quais foi realizada entrevista e aplicado um questionário entre os produtores a fim de identificar os pontos fortes, fracos, oportunidades e ameaças, através de matriz SWOT .

Análise qualitativa da pesquisa de campo
Apesar da fragilidade associativista encontrada no discurso dos entrevistados constatou-se que foi feito um esforço em 2002, com a criação de uma associação entre os produtores de rãs, com o objetivo de resolver os problemas do setor naquela região além de atender a um pedido da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro para que se formassem associações locais para gerirem o Pavilhão de Guaratiba, que seria um Centro de Comercialização da Produção Local, de diversos produtos. Projeto este que não foi concretizado. Somente com a concretização deste projeto poderia se pensar em real Desenvolvimento local, gerando emprego e renda na região. A Associação deu seguimento a seus objetivos e possuía oito associados, estando sediado na localidade de Vargem Pequena, bairro vizinho a Guaratiba tendo como missão principal contribuir para o desenvolvimento da ranicultura, articulando e fortalecendo a união entre os ranicultores do Estado do Rio de Janeiro e criando mecanismos para que os obstáculos que esta atividade impõe, fossem superados.


Percebe-se pela pesquisa, que o caráter individualista dos ranicultores sobrepõe o trabalho inter-relacionado dificultando assim qualquer proposta associativista, porém são relevantes algumas informações colhidas e tratadas de forma empírica.


O trato do trabalho de forma individual foi verificado no discurso de 60% dos entrevistados quando procuram apresentar suas potencialidades seja de conhecimento técnico ou de forma econômica ou ainda de sucesso em algumas experiências realizadas na criação de rã, sendo estes fatores veiculados ao que remete ao contexto “Sou melhor”, o que não está em questão, pois demonstra que eles não conhecem as vantagens competitivas com o inter-relacionamento na prática associativista. A falta de companheirismo é citada por alguns dos entrevistados bem como a competitividade acirrada como problema da associação formalmente criada pela RASS, tendo sido apontada a cultura local como fator de discórdia pessoal e do não prosseguimento do trabalho.


A falta de credibilidade no poder público foi destacada por todos os entrevistados, pois nenhum dos projetos apresentados pelos governos teve continuidade, principalmente no projeto da Prefeitura municipal quanto à instalação de uma via turística na região com produtos rurais e pólo gastronômico, o chamado turismo rural, que foi tratado na visão dos entrevistados como forma de legalizar a produção para fins de arrecadação de impostos municipais, tanto de ranicultores, quanto dos produtores de plantas ornamentais, os quais também foram incluídos no projeto.


Em sua totalidade os entrevistados destacaram a liderança como fator negativo, pois, segundo os mesmos, os líderes têm dificuldade no tratamento aos associados. Falta um padrão metodológico na criação e ainda na fertilização artificial. O grupo apresentou uma grande resistência a novas tecnologias, porém entendem que uma cartilha de produção como uma linha de montagem poderá ser uma solução para que muitos produtores voltem a produzir, visto que esta atividade não é a principal fonte econômica para os entrevistados.

Considerações finais
Este trabalho teve como objetivo central a verificação da existência de associativismo entre os ranicultores de Guaratiba. O associativismo é um fator endógeno acontecendo pelas sinergias de uma comunidade local movimentado pelo capital social. A falta deste ou pouca expressividade percebida nos ranicultores de Guaratiba representa pouco envolvimento social com perspectivas apenas econômicas, o que remete a uma dificuldade de relacionamento interpessoal, com aspirações individuais esquivando do objetivo coletivo, sendo assim a ausência deste capital traduz a não existência de associativismo e consequentemente determina grande dificuldade para o desenvolvimento local.


 O processo de validação dos resultados determinantes para ausência do associativismo na região de Guaratiba foi estabelecido pela pesquisa de campo junto aos ranicultores que expuseram suas posições através dos dados coletados em entrevistas e respostas ao questionário que foram analisados de forma qualitativa.


A visão sobre empreendedorismo por parte dos entrevistados estabelece uma forma introspectiva de caráter individualizado e não coletivo, pois foi dentre as demais características para formação do associativismo a que apresentou os números mais favoráveis, ou seja, ao tratar de si mesmos houve uma tendência a valorização própria.


Outro resultado que merece destaque foi a característica “atuação do poder público” o que deveria ser alvo de retomada de trabalho com atitudes sociais por parte dos ranicultores caso houvesse capital social, mas passou a ter enfoque crítico de abandono pelos governantes, por falta de políticas públicas adequadas ou a inexistência destas.


O baixo índice de densidade demográfica da região com grande concentração de área verde e tendência a atividades rurais ratifica uma cultura com valores regionais sólidos e tradicionais o que representa uma resistência de implantação de novos valores, ideias e ações com níveis de desconfiança altos, o que seria mais um fator de dificuldade de um processo de associação acirrando a competição em contrariedade a cooperação.


Neste estudo pode-se se verificar também que existem relações de influências entre as características para formação do associativismo, ficou evidente que a falta de liderança empreendeu a pouca ou até inexistente governança o que pode ter sido determinante pela falta de atuação dos poderes públicos que por sua vez não agiu em prol da formação de redes e cooperação entre os ranicultores de Guaratiba comprometendo também todas as ações estratégicas para melhoria da atividade naquela região.


Nesta mesma linha de pensamento destacou-se a característica de culturas e valores regionais com traços de forte tradição podendo impedir o horizonte de inovações tecnológicas ratificadas pela falta de acesso a serviço financeiro para os produtores locais. 


A predominância de pontos fracos e ameaças depois da aplicação da matriz SWOT alavancam uma cultura produtiva de sobrevivência tendendo a liquidação do negócio caso não seja feito uma política de sustentabilidade da atividade produtora na região, mas com trato principal nas sinergias para desenvolvimento de capital social. Tal feito depende de interação de alguns atores principais.


A partir dos resultados, o Desenvolvimento local é ratificado em seus aspectos teóricos pelas necessidades de especialização da região com o objetivo de crescimento econômico baseado na percepção dos intangíveis como capital social e variáveis humanas para formação associativista e consequente aumento de qualidade de vida mensurado pelo IDH que pode servir de referência para constatação de desenvolvimento naquela região, com interferência do poder público tanto no apoio estrutural quanto de forma gerencial; para tal o comprometimento do poder público através de políticas de fomento deveria ser incessante quando da tentativa de criação de um ambiente que estimulasse compras e vendas conjuntas.


Utilizando-se das observações de campo, pode-se afirmar que no local existe a necessidade de uma atuação mais efetiva da governança como instrumento possível para iniciar um processo real de associativismo em torno da atividade de ranicultura em Guaratiba, deixando para trás à frustração e a desconfiança que passa a ser característica da comunidade local e construindo uma ideia inicial de desenvolvimento para a região.

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“O termo SWOT é uma combinação das primeiras letras das palavras (em inglês) Forças (Strengths), Fraquezas (Weaknesses), Oportunidades (Opportunities) e Ameaças (Threats) e costuma ser creditada a dois professores da Harvard Business School, uma importante instituição de ensino dos EUA. A Análise SWOT é uma ferramenta-conceito utilizada para fazer a análise de um cenário (ou de um ambiente), proporcionando a base para o planejamento estratégico e o gerenciamento de uma empresa”. Disponível em http://mail.administradores.com.br/informe-se/artigos/o-que-e-analise-de-swot/28174/ . Acesso em 15 de abril 2010.

 

Referências Bibliográficas
ALBAGLI, S. , MACIEL, M. L., “Capital social  e desenvolvimento local” : In: Pequena Empresa Cooperação e desenvolvimento local. Rio de Janeiro, Relume Dumara, UFRJ 2003.
BORIN, E. C. P., O Sebrae e os arranjos produtivos locais : o caso de Nova Friburgo/RJ.  Tese (Doutorado em Planejamento Urbano e Regional)–Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006.
FONTANELLO, D., FERREIRA, C. M. Histórico da ranicultura nacional, Instituto de pesca – SP, 2006. Disponível em http://www.aquicultura.br/historico.htm , acesso em 20 de agosto de 2009.
IBGE, Censo Demográfico 2000.
INSTITUTO PEREIRA PASSOS, Disponível em http://www0.rio.rj.gov.br/ipp/ . acesso em 12 de abril de 2009.
LIMA, F.G.F., MORÉ, J.D., PURIFICAÇÃO, O modelo mental da governança do apl de moda íntima de Nova Friburgo sobre cultura empreendedorismo e inovação, XXV Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica, ANPAD, Brasília, 2008
PETITINGA, C. S. , Mais definições em trânsito, desenvolvimento local, 2008. Disponível em  http://www.cult.ufba.br/maisdefinicoes/DESENVOLVIMENTOLOCAL.pdf , acesso em 22 de fev de 2010.
PINTO, J. R. L. , Economia solidária de volta a arte da associação. Rio Grande do Sul: Editora da UFRGS, 2006.
SEBRAE – Programa Alianças estratégicas – Ranicultores RJ, 2003/ Marlize Porto e Regina Alencar.

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Recebido em: 20/111/2013
Aceito em: 13/12/2013

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