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ENSINO DE METODOLOGIA CIENTÍFICA PARA ALUNOS DOS CURSOS TÉCNICOS: ESTUDO DE CASO NO INSTITUTO FEDERAL DO AMAPÁ

VINÍCIUS BATISTA CAMPOS é Engenheiro Agrônomo, Professor Doutor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá, Campus Laranjal do Jari.

KAROLINE FERNANDES SIQUEIRA é Bacharel em Secretariado, professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá, especialista em Metodologia do Ensino Superior.


Resumo:Objetivou-se, com o presente trabalho, verificar o perfil dos discentes que ingressaram no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá, Campus Laranjal do Jari e estão cursando a disciplina de metodologia da pesquisa científica. A pesquisa foi realizada entre maio e junho de 2011 (referente ao 2º bimestre do calendário letivo), utilizando-se um questionário contendo perguntas objetivas e subjetivas. No total foram entrevistados 151 alunos dos cursos técnicos integrados do IFAP (informática, meio ambiente e secretariado). Abordaram-se temas a exemplo da leitura, local de conclusão do ensino fundamental, interpretação de textos, cálculos matemáticos, conhecimento em ciências, importância da metodologia da pesquisa científica para a formação técnica e assuntos ministrados no primeiro bimestre. Vários são os fatores que proporcionaram um impacto negativo a alguns alunos do IFAP Laranjal do Jari ao cursarem metodologia da pesquisa científica, a exemplo de um ensino fundamental com limitações, falta de incentivo à leitura, ausência de atividades práticas e uso de metodologias de ensino ultrapassadas. Para trazer o aluno para o ambiente da cientificidade, vem sendo indispensável à inserção de trabalhos textuais (escrita e leitura), dinâmicas em grupo, correlação da metodologia da pesquisa científica com a área específica, técnicas de apresentação de seminários, buscando, com todas essas ferramentas, contribuir para formação de um técnico com habilidades básicas de pesquisa.

Palavras-chave: Laranjal do Jari, Amazônia, educação, ciência.

 

SCIENTIFIC METHODOLOGY FOR TEACHING STUDENTS OF TECHNICAL COURSES: A CASE STUDY IN THE FEDERAL INSTITUTE OF THE AMAPÁ

Abstract: The aim of the present work, check the profile of the students who entered the Federal Institute of Education, Science and Technology of Amapá (IFAP), Campus Laranjal do Jari and are studying the discipline of scientific research methodology. The survey was conducted between May and June 2011 using a questionnaire subjective and objective. In total 151 respondents were students of technical courses integrated IFAP (IT, environment and secretariat). Was approached topics like reading, local completion of elementary education, reading comprehension, math, science knowledge, importance of scientific research methodology for training and technical subjects taught in the first two months. There are several factors that provided a negative impact for some students of the methodology of scientific research, the example of a school with limitations, lack of incentives for reading, lack of practical activities and use of outdated teaching methodologies. To bring the student to the scientific environment, has been indispensable to insert textual work (writing and reading), group dynamics, correlation of the methodology of scientific research in the specific area, presentation skills seminars, seeking, with all these tools, contribute to the formation of a technical skills with basic research.

Keywords: Laranjal do Jari County, Amazon, education, science.

Introdução

A educação básica no Brasil ganhou contornos bastante complexos nos anos posteriores à Constituição Federal de 1988 e, sobretudo, nos últimos oito anos. Analisá-la não é fácil exatamente porque as contingências que a cercam são múltiplas e os fatores que a determinam têm sido objeto de leis, políticas e programas nacionais, alguns dos quais em convênio com órgãos internacionais. A própria etimologia do termo base nos confirma esta acepção de conceito e etapas conjugadas sob um só todo. Base provém do grego básis,eós e significa, ao mesmo tempo, pedestal, suporte, fundação e andar, pôr em marcha, avançar. A educação básica é um conceito mais do que inovador para um país que, por séculos, negou, de modo elitista e seletivo, a seus cidadãos o direito ao conhecimento pela ação sistemática da organização escolar (CURY, 2002).

Os avanços não apenas na educação básica, mas em todos os níveis de conhecimento, vem historicamente acontecendo no país, ou seja, mais alunos alfabetizados, concluintes do ensino médio, ingressantes em universidades, entretanto, muitas vezes, o senso crítico desse público é restrito.

A maioria dos alunos das primeiras séries do ensino médio não sabe estudar, não está acostumado, não foi orientada para dividir o tempo entre diversão, estudo e afazeres domésticos. Sem orientação, sente-se perdida. Muitas vezes, os alunos encontram professores despreparados, gestores também despreparados, e é aí que a situação se agrava. Os alunos já cansaram de ouvir, nas reuniões pedagógicas, que a missão de sua escola é formar cidadãos competentes, éticos, solidários, comprometidos com a transformação de uma sociedade mais justa (ARRUDA, 2007).

Nas séries básicas, a proposta de alguns docentes, é dissociar os conhecimentos abordados em sala de aula com iniciação a ciência e pesquisa, tornando algo de difícil alcance. Andrade (1997) conceitua a ciência como a atividade que propõe a aquisição sistemática do conhecimento sobre a natureza biológica, social e tecnológica. Para Cervo e Bervian (1983), afirma que a principal função da ciência é o aperfeiçoamento do conhecimento em todas as áreas para tornar a existência humana mais significativa.

Segundo Burgardt (2006), já não basta sermos criaturas, deveremos ser criadores. O tempo passou, e a Humanidade continua sua busca por este ideal, que é a raiz da pesquisa científica. Além de usar o conhecimento na construção de um mundo melhor para si, o homem também passou a pensar em seu próximo. Assim, a pesquisa científica ganha contornos de responsabilidade social.

Nesse sentido, objetivou-se com essa pesquisa, conhecer o perfil do aluno ingressante nos cursos médios integrados ao técnico do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá (IFAP), Campus Laranjal do Jari na ótica da disciplina de metodologia da pesquisa científica.

Metodologia

A pesquisa foi conduzida entre maio e junho de 2011(1) nas dependências da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), as quais foram cedidas ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá (IFAP), Campus Laranjal do Jari.

O município de Laranjal do Jari situa-se na região ocidental do estado do Amapá, fazendo limites com Municípios de Vitória do Jari, Mazagão, Pedra Branca do Amaparí, Estado do Pará, Suriname e Guiana Francesa. Tornou-se município em dezembro de 1987. Antes disso, pertencia ao município de Mazagão. Sua área total é de 32.166,29 Km2, enquanto que a área da cidade, sede do município, é de 18,5 Km2. No que se refere à educação, existem escolas de ensino fundamental e médio, das redes municipal, estadual e particular (CLARETO, 2003).

O IFAP, Campus Laranjal do Jari, iniciou suas atividades com os cursos integrados, em março de 2011, tendo os cursos de informática, meio ambiente e secretariado. Ao todo estão matriculados 200 discentes em dois turnos (matutino e vespertino). No primeiro ano dos três cursos, os alunos estão matriculados nas disciplinas do núcleo geral (matemática, português, física, química, biologia, geografia, história, inglês, educação física) e da formação técnica, além de metodologia da pesquisa científica (núcleo diversificado).

Para realização da pesquisa utilizou-se um questionário contendo perguntas objetivas e subjetivas com a finalidade de conhecer algumas limitações que os alunos possuem sobre as disciplinas estudadas no ensino fundamental, problemas esses que pudessem influenciar negativamente no rendimento do componente curricular metodologia da pesquisa científica. Abordaram-se temas a exemplo da leitura, local de conclusão do ensino fundamental, interpretação de textos, cálculos matemáticos, conhecimento em ciências, importância da metodologia da pesquisa científica para a formação técnica e assuntos ministrados no primeiro bimestre.

Os questionários foram aplicados em sala de aula e de forma opcional para os alunos interessados em participarem da pesquisa, objetivando, com isso, eliminar a coleta de informações mascaradas. Discentes dos cursos integrados realizaram a coleta dos dados, resultando num total de 151 questionários aplicados, sendo que os dados desses alunos foram excluídos do trabalho.

Usou-se o método estatístico descritivo para analisar os dados. Após a coleta desses, com auxílio de planilha computacional, realizou-se a construção dos gráficos.

Resultados e discussão

De acordo com a Figura 1, pode-se verificar que mais de 60% dos alunos entrevistados dos cursos técnicos do IFAP têm até 15 anos de idade, sendo observados alunos com idade de 13 anos. Cerca de 30% estão numa faixa etária entre 16 e 18 anos e ainda 8% acima dos 18 anos. Em turmas dos cursos de meio ambiente e secretariado registrou-se discentes acima de 40 anos.

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Figura 1
. Faixa Etária dos alunos entrevistados

Essa variabilidade etária nos cursos integrados do IFAP Laranjal do Jari deve-se a alguns alunos decidirem retornar ao primeiro ano do ensino médio, justificando o baixo aproveitamento no ensino fundamental e deficiências em algumas matérias básicas, a exemplo de matemática e português. Outra explicação está associada à oportunidade de estudar numa instituição federal (IFET), a qual estará proporcionando conhecimento diversificado e, futuramente, os técnicos formados nas distintas áreas de atuação serem absorvidos pelo mercado de trabalho. Segundo Krüger e Tambara (2006), a predominância do aluno que ingressavam no Ensino Médio do CEFET em 2003, encontrava-se na faixa etária de até 14 anos e, quando somamos à faixa etária seguinte, de 15 anos, observamos que mais de 80% do alunado encontrava-se neste grupo. Isto mostra que o Ensino Médio é composto por alunos bastante jovens, que ainda não têm uma opção profissional e procuram o CEFET, por ser uma instituição pública, gratuita e com um Ensino Médio de qualidade. Por isso umas das modalidades ofertadas atualmente pelos institutos federais é o curso técnico integrado ao ensino médio.

No IFAP Laranjal do Jari, dos alunos entrevistados, quase a totalidade desses (97%) terminaram o ensino fundamental em escola pública e apenas 3% provém do ensino particular (Figura 2). Essa é uma realidade nacional, onde, principalmente no interior das unidades de federação, o número de alunos que concluem o ensino fundamental e médio vem da escola pública. O principal ponto pela escolha dessa educação está associado ao poder econômico das famílias do município de Laranjal do Jari. A grande maioria dessas escolas possui infraestrutura limitada, dificultando o processo ensino-aprendizagem. Para Gadoti (1999), o Governo Federal tem adotado políticas seletivas, no sentido de corrigir as disparidades regionais. Contudo, apesar da discriminação positiva, especialmente em relação ao Norte-Nordeste, na distribuição dos recursos públicos vinculados à função educação, sabe-se que, na maioria das vezes, o dinheiro não chega onde deveria chegar.

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Figura 2
. Local (rede de ensino) da conclusão do Ensino fundamental dos entrevistados

A leitura é uma ferramenta de vital importância para incrementar o senso crítico do indivíduo, bem como aumentar o leque de conhecimento sobre diversos assuntos. Pela Figura 3, pode-se constatar que 79% afirmaram ter interesse pela leitura e apenas 21% mencionaram desgostar ou não possuir o hábito da leitura. Dos alunos entrevistados, alguns comentaram que a atração pela leitura está associada à temática do livro, revista, jornal, site, bem como à sua formatação [cores e ilustrações (presença de gráficos, figuras, tabelas, etc.)]. Ainda, segundo o relato dos discentes, não existe estímulo para ler, quando ocorre, sempre a condicionam ao caráter de obrigatoriedade e/ou pontuação, dificultando assim a prática constante da leitura.

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Figura 3.
Interesse por leitura pelos entrevistados

Partindo do pressuposto que, segundo Tedesco (2005), na ciência inexiste verdade absoluta, a renovabilidade de informações é extremamente elevada e essa ciclicidade não seria diferente nas áreas de informática, meio ambiente e secretariado, justificando a necessidade constante e periódica da leitura. Para Chassot (1995, p. 23), atualmente, o que se discute e o que se busca implementar é uma educação voltada para uma formação integral do indivíduo, que abarque, sobretudo, conhecimentos que possibilitem ao indivíduo “uma melhor leitura do mundo”.

Smith (1989, p. 36), afirma que: “A leitura é uma atividade carregada de pensamentos. Para o autor, a leitura apoiasse em dois pilares: o visual e o não-visual. O visual é o que o autor fornece ao leitor, através de determinados signos que quanto mais chamativos, mais interesse despertará no leitor. Já o não-visual está dentro do leitor; diz respeito aos conhecimentos que ele já possui, que lhe servirão de base para o entendimento das informações e novos conhecimentos, inseridos no texto”.

Observa-se pela Figura 4 que, dos alunos entrevistados, mais de 80% possui algum tipo de dificuldade na resolução de cálculos básicos de matemática e apenas 14% conseguem executá-los com facilidade. Uma problemática comentada pelos entrevistados, em relação ao ensino de matemática, está associada aos mecanismos de ensino, onde, para a maioria, são corriqueiros e não despertam o interesse deles para compreender os métodos matemáticos. Para alguns, fica distante a aplicação prática desses teoremas, pois os métodos usados no processo ensino-aprendizagem poderiam aperfeiçoar tal aproximação, a exemplo de jogos matemáticos, aplicação de cálculos no dia a dia, implantação de experimentos, entre outros. A relação existente entre cálculos matemáticos e metodologia da pesquisa científica é bem marcante, tendo em vista que o raciocínio contribui nos projetos de pesquisa para elaboração de hipóteses, formulação do problema, elaboração das metas, entre outros.

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Figura 4.
Dificuldade na execução de problemas matemáticos (cálculos) pelos entrevistados

Para Clareto (2003), a matemática tem sido a grande narrativa – ou metadiscurso – da ciência moderna. Ela é a legitimadora de todo conhecimento científico. Aliás, a modernidade tem sido marcada pela articulação do conhecimento de tal modo que qualquer saber que não tenha como modelo a racionalidade matemática, suas técnicas e linguagem, são considerados “nãossaber”, “nãoconhecimento”, “nãociência”, ou, simplesmente, “senso comum”, “superstição”, “mito”. Por conta disso, a própria sociedade moderna ocidental acaba sendo, ela mesma, legitimada pela racionalidade da matemática, uma vez que, nesta sociedade, ciência é sinônimo de “progresso social” (ou seja, econômico, tecnológico e industrial) e tudo, ou quase tudo, pode ser feito, e de fato tem sido feito, em nome deste progresso.

A leitura deve ser um hábito para uma correta interpretação dos textos, portanto é necessário exercitá-la. Pela Figura 5, constata-se que cerca de 70% dos alunos possuem um nível de interpretação de texto médio, 15% conseguem interpretar textos sem dificuldades e apenas 12% tem problemas para interpretar textos. De acordo com Kleiman (1996), certa dificuldade de leitura somada ao pouco hábito de ler aponta para uma possível falta de familiaridade com o texto escrito, em suas diferentes modalidades. Isto é relevante porque as habilidades de leitura e interpretação de informações numéricas contidas no diferentes tipos de texto instrumentalizam melhor o sujeito para lidar com as informações.

Figura 5. Nível de interpretação de texto dos entrevistados

Conclusões

Vários são os fatores que proporcionaram um impacto negativo a alguns alunos do IFAP Laranjal do Jari ao cursarem metodologia da pesquisa científica, a exemplo de um ensino fundamental com limitações, falta de incentivo à leitura, ausência de atividades práticas e uso de metodologias de ensino ultrapassadas.

Para trazer o aluno para o ambiente da cientificidade, vem sendo indispensável a mudança de paradigmas com a inserção de trabalhos textuais (escrita e leitura), dinâmicas em grupo, correlação da metodologia da pesquisa científica com a área específica, técnicas de apresentação de seminários, buscando, com todas essas ferramentas, contribuir para formação de um técnico com habilidades básicas de pesquisa.

 

NOTAS:

(1) Período referente à parte do segundo bimestre do calendário letivo.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ARRUDA, G.S. Os desafios para a iniciação científica no ensino médio integrado ao técnico. Revista Igapó, v.01, p.-38-44, 2007.

BURGARDT, L. Por que fazer pesquisa com responsabilidade social?- Ações de âmbito social são valorizadas em concursos e pela sociedade. Universia Brasil, São Paulo, fev 2006.

CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia Científica. 3.ed. São Paulo: Mc Graw-Hill do Brasil, 1983.

CHASSOT, A. I. Catalisando transformações na educação. 3ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 1995.

CLARETO, S.M. Terceiras margens: um estudo etnomatemático de espacialidades em Laranjal do Jari (Amapá). 254 f. 2003. (Tese Doutorado). Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, São Paulo.

CURY, C.R.J. A educação básica no Brasil. Educ. Soc., Campinas, vol. 23, n. 80, p. 168-200, 2002.

GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre, Artes Médicas, 1999.

KLEIMAN, A. Oficina de Leitura: teoria e prática. São Paulo: Unicamp. 1996.

KRÜGER, E.; TAMBARA, E. O Perfil dos alunos do Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas – CEFET-RS durante a vigência do Decreto 2.208/9. Unirevista. v.1, n.2, p.1-13, 2006.

LAKATOS, E.M.; MARCONI, M.A. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

MAIA, R.T. A importância da disciplina de metodologia científica no desenvolvimento de produções acadêmicas de qualidade no nível superior. Revista Urutágua, nº 14, 2008.

SMITH, Frank. Compreendendo a leitura: uma análise psicolingüística da leitura e do ato de ler. (Trad. Daise Batista). Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

TEDESCO, P. A teoria da ciência e o conhecimento científico. 2005. 35p. (Apostila).

Recebido em: 03/12/2012

Aceito em: 15/08/2013

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