Questões Contemporâneas

COMO ESTAREMOS NA VELHICE? REFLEXÕES SOBRE ENVELHECIMENTO E DEPENDÊNCIA, ABANDONO E INSTITUCIONALIZAÇÃO

PAULO MEDEIROS é Fisioterapeuta, Aluno de Especialização em Atividade Física, Desempenho Motor e Saúde (UFSM),Aluno Programa Especial de Graduação Formação de Professores para Educação Profissional (PEG-UFSM) Grupo de Pesquisa Saúde e Funcionalidade no Envelhecimento Humano (UFSM), Membro da Comissão Organizadora II Seminário Interdisciplinar Sobre Envelhecimento e Institucionalização


Resumo: O envelhecimento da população mundial se apresenta como uma questão contemporânea que merece debate e atenção. Porém, a sociedade, apesar das constantes vinculações da temática nos meios de comunicação, parece não se preparar ou pensar na própria velhice. O presente artigo busca trazer uma discussão sobre a temida relação entre o processo de envelhecimento e a dependência de cuidados que podem levar ao abandono e à institucionalização. Entende-se que não existe apenas uma maneira de envelhecer e que o envelhecimento está presente em nossas escolhas e hábitos de vida diários, mas que não se pode fugir das alterações biopsicossociais inerentes a esse processo. O envelhecimento precisa ser melhor trabalhado desde cedo nos ambientes sociais, pois o futuro é resultado do presente e depende de nós semear um futuro de dignidade e respeito aos idosos que seremos, mesmo que dependentes de cuidados e institucionalizados.
Palavras chave: envelhecimento, dependência, abandono, institucionalização.
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HOW WE WILL BE IN OLD AGE? REFLECTIONS ON AGING AND DEPENDENCE, AND ABANDONMENT INSTITUTIONALIZATION

Abstract: : The aging world population presents itself as a contemporary issue that deserves attention and debate. However, the company despite the constant theme of linkages in the media seems not to prepare or think about their own old age. This article aims at a discussion on the relationship between the dreaded aging process and care dependency that can lead to abandonment and institutionalization. It is understood that there is only one way of aging and that aging is present in our choices and habits of daily life, but you can not escape the biopsychosocial changes inherent in this process. The best age to be worked early in social environments, because the future becomes the present result and that depends on us to sow a future of dignity and respect for the elderly that will be, even if you are dependent and institutionalized care.
Keywords: Aging, Dependency, Abandoned, Institutionalization.

INTRODUÇÃO

A questão do envelhecimento e da longevidade sempre esteve presente na história da humanidade, porém nunca se enfatizou tantos debates sobre o tema. Os avanços da ciência estão todos os dias circulando nos meios de comunicação, mesmo que não estejamos disponíveis ou interessados no assunto. O envelhecimento populacional é, portanto, atualmente um fenômeno mundial incontestável, o que significa dizer que há um crescimento mais elevado da população idosa em relação aos demais grupos etários. No final do século passado eram estimados 590 milhões de indivíduos idosos no mundo, em 2005 a projeção foi de 1 bilhão e 200 milhões com a perspectiva de atingir 2 bilhões em 2050. Assim, pela primeira vez na história da humanidade, o número de pessoas com mais de 60 anos irá superar o número de crianças e adolescentes (FREITAS, 2006).

O Brasil está entre os países que possuem as maiores taxas de envelhecimento populacional, e segundo as projeções da Organização Mundial de Saúde (OMS), até o ano de 2025, o grupo de pessoas com 60 anos ou mais de idade deverá aumentar em quinze vezes, enquanto a população total, em apenas cinco. Esse aumento tornará o país a sexta nação com maior número de idosos, apresentando cerca de 32 milhões de pessoas nessa faixa etária (BRASIL, 2010).

Sabe-se que o processo de envelhecer é natural, universal e irreversível, portanto, ocorre com todos os povos. Pressupõe não só alterações biológicas, mas também psicológicas e sociais, que podem acontecer em idade mais precoce ou mais avançada, e em maior ou menor grau, variando conforme as características genéticas e o estilo de vida de cada pessoa (D’ALENCAR, 2005).

Embora o envelhecimento ativo seja algo tão preconizado, hoje em dia, na busca de um envelhecer com qualidade, as mudanças biológicas, psicológicas e as mudanças nas exigências sociais constituem fatores de risco em potencial que deixarão o idoso mais suscetível à dependência parcial ou total nas suas atividades de vida diária (COSTA; NAKATANI; BACHION, 2006).

A sociedade contemporânea e capitalista, em que vivemos, supervaloriza o consumo, o novo, a produtividade, em detrimento do velho, que passa a ser considerado ultrapassado e não valorizado. Assim, ao mesmo tempo em que se potencializa a longevidade nega-se aos velhos o seu valor e importância social, o que traz associações negativas relacionadas à velhice. Essas associações atravessam os séculos e, ainda hoje, fazem com que essa etapa da vida seja vista como detestável, mesmo com tantos recursos para prevenir e retardar os processos negativos do envelhecimento (SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008).

Com isso, grande parte das pessoas acaba não querendo se aproximar ou nem mesmo pensar no seu processo de envelhecimento, mesmo que este seja algo contínuo e gradativo, todos os dias de nossas vidas. Parece existir um temor implícito, no senso comum, ao relacionar a sua velhice a um ciclo de envelhecimento com dependência e que poderá acarretar situações de abandono e, até mesmo, institucionalização. O fato é que envelhecer faz parte da vida, sendo um processo do qual não se pode fugir e mesmo que influenciado pelas nossas escolhas existirão mudanças inerentes que afetarão o nosso cotidiano. Sendo assim, esse artigo traz um breve ensaio sobre o processo de envelhecer, buscando instigar reflexões sobre como, onde e com quem estaremos na velhice.

Envelhecimento e dependência

Segundo Carvalho Filho e Papaléo Netto (2000), o envelhecimento é um processo que ocorre de maneira completa no indivíduo, envolvendo alterações morfológicas, funcionais, sociais e psicológicas. Do ponto de vista biológico, o envelhecer tem início desde o começo da vida, quando células, tecidos e órgãos vão se maturando e sofrendo modificações. No entanto, pouco se sabe sobre a origem e a dinâmica desse processo, havendo tentativas de explicá-lo por meio de diversas teorias (MAZO; LOPES; BENEDETTI, 2004). Já Zimerman (2000) relaciona o envelhecimento como um processo influenciado pelo estilo de vida, o qual leva em consideração hábitos alimentares, prática de exercícios, exposição ao sol, estimulação mental e atitudes perante a vida.

Nesse processo, vão ocorrendo perdas orgânicas e funcionais gradativas, cujo ritmo e intensidade variam de acordo com as características genéticas de cada pessoa. Essas mudanças levam à diminuição da capacidade que cada indivíduo tem para adaptar-se ao meio-ambiente, tornando-o mais exposto e vulnerável a processos patológicos, os quais naturalmente provocam um declínio físico (ZIMERMAN, 2000; SANTOS, 2001; HAMILTON, 2002).

Portanto, à medida que o ser humano envelhece, muitas tarefas do cotidiano consideradas banais e, portanto, de fácil execução vão paulatinamente e, muitas vezes, de forma imperceptível tornando-se cada vez mais difíceis de serem realizadas, até que o indivíduo percebe que já depende de outra pessoa para tomar um banho, por exemplo (ARAÚJO;CEOLIM, 2007).

A deterioração dos parâmetros físicos, como força muscular, resistência muscular, equilíbrio, flexibilidade, agilidade e coordenação, leva à limitação funcional que poderá ocasionar a dependência física, ou seja, se os parâmetros físicos declinarem abaixo do nível requerido para a realização das atividades da vida diária, como cuidados pessoais básicos, como se vestir, banhar-se, levantar-se da cama e sentar-se numa cadeira, utilizar o banheiro, comer e caminhar, isto resultará em dependência funcional e acabará influenciando na qualidade de vida do idoso (OKUMA, 1999).

A capacidade funcional pode ser definida como o potencial que os idosos apresentam para decidir e atuar em suas vidas de forma independente, no seu cotidiano. Assim, abrange a capacidade de o indivíduo manter competência, habilidades físicas e mentais para um viver independente e autônomo. Em outras palavras, capacidade para realização das atividades básicas de vida diária (AVD) e atividades instrumentais de vida diária (AIVD), ou seja, as atividades que fazem parte da rotina do dia a dia, como tomar banho, vestir-se, manter a continência, deslocar-se, alimentar-se, fazer compras, telefonar, tomar seus remédios (BRASIL, 1999; GUIMARÃES et al., 2004; ROSA et al., 2003; FIEDLER; PERES 2008).

Quando ocorre o comprometimento da capacidade do idoso realizar as atividades básicas da vida diária (AVD) e as atividades instrumentais da vida diária (AIVD), isso se reflete diretamente sobre o autocuidado, fazendo com que, a médio e longo prazo, surja a necessidade de cuidados de longa permanência, geralmente com altos custos (GUIMARÃES et al., 2004). Dessa forma, a incapacidade funcional é um problema social, que traz maior risco de institucionalização e altos custos para os serviços de saúde (KAWAMOTO; YOSHIDA; OKA, 2004).

Estudos indicam que o comprometimento da capacidade funcional esta relacionado positivamente com a idade avançada, baixo grau de escolaridade e renda, sexo feminino, hospitalizações, institucionalização, alto índices de co-morbidades, rearranjos multigeracionais, declínio cognitivo e presença de depressão. Entretanto, observa-se que também é influenciada por fatores demográficos, sócio-econômicos, culturais e psicossociais. (PERRACINI; FLO, 2009; FIEDLER; PERES, 2008; ROSA et al.,2003; MENÉDEZ et al., 2005).

A promoção e a manutenção da autonomia na velhice por maior tempo possível são metas a serem alcançadas na atenção à saúde do idoso, pois refletem uma melhor qualidade de vida que determinará um envelhecimento bem sucedido. Neste sentido, a capacidade funcional surge como um novo paradigma de saúde proposto pela Política Nacional de Saúde da pessoa Idosa (PNSPI), sendo de valor crucial para manter o indivíduo independente e participante na comunidade (BRASIL, 1999; BRASIL, 2006).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estipula que o marco inicial da velhice, nos países em desenvolvimento, é de 60 anos de idade, mas observa que as pessoas com a mesma idade cronológica podem ter características físicas, atitudes e disposição muito diferentes (MAZO; LOPES; BENEDETTI, 2004). Pois, a história de vida, bem como o ambiente em que vivemos, interferem nas características e no modo de envelhecer. Freire Júnior e Tavares (2006) salientam que, no Brasil, são encontrados vários modos de se envelhecer, de acordo com a condição socioeconômica, sexo, moradia, acesso à informação e à educação, cultura e até mesmo pela região onde se reside.

Assim, torna-se claro que apesar de um declínio físico natural e irreversível, não existe apenas uma maneira de envelhecer e também que nem todos os velhos são iguais. Dentro dessa categoria cada vez mais existem idosos que conseguem alcançar a longevidade de maneira satisfatória usufruindo essa etapa da vida com qualidade. Porém, o envelhecimento ainda está ligado à deterioração do corpo, ao declínio e à incapacidade de modo a associar esse evento do ciclo vital com a morte, a doença, o afastamento e a dependência (NERI; FREIRE, 2000).

Ainda, sendo o envelhecimento um processo extremamente complexo, do ponto de vista biológico, psicológico e social, também é influenciado pela sociedade que determina segundo seus interesses o lugar e o papel do idoso. Esta questão está relacionada aos valores da cultura de cada nação. Sendo assim, os arranjos sociais, principalmente ocidentais, são pautados pela lógica do capital e da produtividade, os quais descartam aqueles que estão à margem desse quadro, entre eles os idosos (UCHÔA, 2003; MARQUES; PACHANE, 2010).

Nesse contexto, permeado pela ênfase contemporânea na beleza, juventude e produtividade, na qual o significado social de “ser velho” assume estereótipos negativos, há uma tendência de negar essa fase da vida, como se ela não correspondesse a uma fase do desenvolvimento humano.  Com isto, muitas vezes, os próprios idosos não se reconhecem como tal e falam da categoria “velho” como se não fizessem parte da mesma (ALMEIDA; CUNHA, 2003; JONES, 2006; SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008).

Assim, apesar da questão do envelhecimento ser tão debatida atualmente, parece existir um temor da sociedade em interagir com a velhice, pois estariam lembrando a sua própria velhice e da proximidade com a morte. A maioria das pessoas ilude-se, atrás do mito da eterna juventude, e não abrem espaço para refletir e se preparar para essa fase da vida. Ao entender que se envelhece um pouco todos os dias, a velhice deveria ser trabalhada em vários ambientes sociais, com a participação da escola e da família para ser mais bem entendida e respeitada.

Da mesma maneira, os próprios idosos temem adoecer e envelhecer na condição de dependência, pois, além de sofrer os preconceitos típicos de uma sociedade que não respeita os mais velhos, necessitariam dos cuidados de outras pessoas para sobreviver. Entende-se que a família tem um papel fundamental junto aos seus idosos, porém quando o idoso torna-se dependente, nem todas as famílias desejam ou conseguem arcar com essa responsabilidade. Ainda existem os casos dos idosos que não possuem família para realizar o cuidado de que essas pessoas necessitam. Contudo, em ambas as situações, existe o medo da solidão, do abandono e da institucionalização.

Abandono e institucionalização

A família é uma construção social influenciada pela cultura e contexto histórico, sendo uma instituição importante para a organização humana na sociedade. Essa construção leva em consideração aspectos como a afetividade e solidariedade, sentimentos e ações que podem ser encontrados fora dos laços co-sanguíneos. Na vida do idoso, a família tem um papel fundamental, uma vez que deveria estar presente no seu dia a dia, sofrendo adaptações para lidar com as mudanças do processo de envelhecimento e com as demandas que o idoso pode desenvolver. As adaptações no âmbito familiar serão mais ou menos fáceis, dependendo das relações afetivas desenvolvidas pelos seus membros, construídas no decorrer da convivência. Assim, o idoso poderá ser respeitado ou não pelos seus familiares, dependendo das histórias individuais e coletivas vividas pelos membros de cada família (DUARTE; CIANCIARULLO, 2002; SOUZA; SKUBS; BRÊTAS, 2007).

A legislação brasileira, em sua Constituição, como também o próprio Estatuto do Idos, prevê que a população idosa seja amparada pela família, sociedade e Estado, os quais devem assegurar sua participação na comunidade, dignidade, bem-estar e direito à vida. Além disso, a legislação prioriza que o atendimento ao idoso deve ser exercido pela própria família, em detrimento do asilar, exceto naqueles casos em que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência (BRASIL, 1988; BRASIL, 2005).

No entanto, nem sempre a família consegue exercer essa função ou cumprir com esta responsabilidade, e assim podem ocorrer situações de abandono e/ou asilamento. Para Herédia (2012), o abandono do idoso está relacionado com sua história de vida e com características individuais de cada ser humano, diante das relações interpessoais construídas ao longo da vida, e que, em virtude das fragilidades decorrentes do envelhecimento, tornam-se mais evidentes. Em muitas situações, o abandono/asilamento é reflexo da perda de afetos, representada pela perda do companheiro, de filhos, familiares e amigos. A condição de abandono também pode estar relacionada a situações de fragilidade em que o idoso com incapacidade funcional é gradativamente isolado do circuito familiar, aumentando seu sentimento de dependência pelos limites impostos pela incapacidade.

O abandono na velhice traz um sentimento de tristeza e de solidão, provocado por circunstâncias relativas a perdas, seja envolvendo deficiências funcionais do organismo ou na fragilidade das relações afetivas e sociais que, por sua vez, conduzem a um distanciamento, podendo culminar no isolamento social. Esse sofrimento impede o indivíduo de viver e conviver plenamente e de permanecer inserido na família, no grupo e na cultura. O estar-indefeso, a falta de intimidade compartilhada e a pobreza de afetos e de comunicação tendem a mudar estímulos de interação social e de interesse com a própria vida (HERÉDIA; CORTELLETTI; CASARA, 2004).

Neste contexto, muitas vezes, faz-se necessário que o indivíduo idoso tenha que modificar seu estilo de vida, para residir numa instituição de longa permanência que se caracteriza como um estabelecimento para atendimento integral institucional, cujo público alvo são as pessoas com 60 anos ou mais, dependentes ou independentes, que não dispõem de condições de permanecer com a família ou em seu domicílio. Essas instituições possuem denominações diversas como asilo, abrigo, lar, casa de repouso, clínica geriátrica e ancionato e devem prestar serviços nas mais diversas áreas conforme as demandas do segmento etário (SOCIEDADE BRASILEIRA DE GERIATRIA E GERONTOLOGIA, 2010).

Entre os fatores de risco para institucionalização, a presença de declínio cognitivo e o stress dos familiares cuidadores são dois fatores relevantes. Além disso, morar só, ter suporte social precário, baixa renda, doenças crônico-degenerativas e suas sequelas, hospitalizações recentes e dependência para realizar as atividades de vida diária também são fatores determinantes (FERRETTI, 2004; CHAIMOWICZ; GREGO, 1999). Berruti e Buzeki (2002) afirmam que as mudanças na dinâmica familiar com a introdução da mulher no mercado de trabalho, problemas de habitação, inexistência de apoio domiciliar, capacitação da família, grupos de apoio aos familiares, e ausência de “centros dia” também contribuem para o processo de institucionalização dos idosos.

A criação dos asilos foi uma necessidade que surgiu no passado com o intuito de solucionar problemas gerados pelas doenças, pobreza e mendicância e afastá-los da sociedade. Com o tempo, as pessoas que eram abrigadas nesse tipo de local, ou seja, os pobres, mendigos, loucos, doentes, velhos e crianças foram tratadas de forma diferente e separadas em outros espaços como hospitais, manicômios e orfanatos. Assim, no século XX o termo asilo passou a ser destinado somente para as instituições que abrigavam velhos passando a simbolizar um local de tristeza, abandono e decadência (XIMENES; CÔRTE, 2007).

Goffman (2001,p.11) trata esse tipo de instituição pela nomenclatura “instituição total” e a define como “ um local de residência e trabalho onde um grande número de indivíduos com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada”.

Assim, o poder disciplinar implementado nessas instituições, chamadas de totais, promove a distribuição dos indivíduos no espaço, utilizando procedimentos como o controle do tempo e o enclausuramento. As regras especificam a rotina diária caracterizando um ambiente rígido, no qual os idosos perdem o direito de expressar sua subjetividade e seus desejos (PAVAN; MENEGUEL; JUNGES, 2008).

Essas instituições para idosos apresentam três características que se combinam de maneira diferente: a segregação (isolamento físico e uma política segregadora), tratamento igualitário e simultâneo para todos os residentes (política congregadora) e um grau acentuado de controle (limitação da autonomia permitida). Com a institucionalização há um novo ambiente a se adaptar, com regras e normas a serem cumpridas, além de uma limitação física imposta (STEVENS-LONG apud CUPERTINO, 1996).

Também, percebe-se que os idosos institucionalizados necessitam de maior atenção, suporte e serviços especializados, pois a grande maioria é fragilizada e apresenta morbidades físicas ou mentais. Pelo seu isolamento social, inatividade física e processos psicológicos, subentende-se que quanto maior o tempo de institucionalização, maior a debilidade do idoso (SANTOS; ANDRADE, 2005). Acrescentam Montenegro e Silva (2007) que a institucionalização acelera e/ou acentua a velocidade das perdas funcionais dos idosos, forçando assim o declínio das funções físicas e cognitivas.

A transferência de um idoso de sua casa para a instituição tem um potencial para produzir danos como: depressão, confusão, perda do contato com a realidade, despersonalização e um senso de isolamento e separação da sociedade. Ainda, a dependência física é muitas vezes estimulada, pois os próprios funcionários preferem ajudar os idosos nas suas atividades, quando esses já apresentam inabilidade para executar tarefas simples, embora não sejam incapazes para fazê-las (PAVARINI, 1996).

O idoso independente, quando institucionalizado, pode desenvolver diferentes graus de dependência devido à sua dificuldade em aceitar e adaptar-se às novas condições de vida e à falta de motivação e de encorajamento que são comuns no ambiente asilar (PAVARINI, 1996; GUIA et al, 2002; CAMARGO; LEÃO, 2002).

Para o idoso a admissão em um asilo pode significar a ruptura definitiva dos velhos laços afetivos, como também a necessidade de se submeter a uma vida comunitária convivendo com desconhecidos e deixando para trás seu estilo de vida pessoal e seu cotidiano. É nesse contexto que o residente de uma Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) tem de se adaptar e continuar vivendo. Porém, o isolamento e o gradual esfriamento das relações com as pessoas a quem eram afeiçoados, a separação do calor humano familiar e do círculo de amizade, faz com que esse período seja muitas vezes de sofrimento e solidão (NETO; CARVALHO, 1996; SOUZA, 2003).

Porém, a questão do asilamento torna-se bastante polêmica e gera conflito de opiniões, pois embora prevaleçam os estudos que demonstram associações negativas ao processo de asilamento ligado ao isolamento, a baixa auto-estima, declínio funcional, entre outros efeitos. Também existe uma corrente de estudiosos que recomendam essas instituições para àqueles idosos que possuem dependência total e impossibilidade de recuperação, levando-nos a considerar o valor social dessas instituições. Ainda, deve- se considerar a importância dessas instituições àqueles idosos que moram sós e que não têm família, pois esses locais tornam-se um lugar de proteção e de cuidado em situações de vulnerabilidade social (TELLES FILHO; PETRILLI FILHO, 1999).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das considerações apresentadas entende-se que o envelhecimento é um fenômeno que atinge todos os povos com impacto mundial e que vem ganhando cada vez mais destaque nos meios de comunicação. Porém, ao mesmo tempo em que a longevidade é debatida e enfatizada pela ciência, os velhos não estão sendo valorizados e respeitados pela sociedade que se debruça sobre outros valores, de ordem capitalista.

Com isso, ser velho assume associações negativas, as quais a sociedade e os próprios idosos não querem se identificar e acabam de certa maneira negando esta etapa do ciclo vital. Da mesma maneira entende-se que não existe apenas uma maneira de envelhecer e que muitas pessoas conseguem chegar à velhice com qualidade.

Contudo, mesmo que o envelhecimento esteja presente em nossas escolhas e hábitos de vida diários, não se pode fugir das alterações biopsicossociais inerentes ao processo e que deveriam ser melhor trabalhadas desde cedo nas escolas e nas famílias e incentivas por políticas públicas para que a sociedade esteja preparada para envelhecer. Dessa maneira, talvez as pessoas não tivessem tanto medo de se aproximar ou pensar na sua velhice imersa num ciclo de dependência, abandono e institucionalização, pois entenderiam que o futuro torna-se resultado do presente e que depende de nós semear um futuro de dignidade e respeito aos idosos mesmo que estejam dependentes de cuidados e institucionalizados.


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Recebido em 23/05/2012
Aceito: 06/2012

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