PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NACIONAL: UM OLHAR PARA A VARIÁVEL AMBIENTAL

SANDRA SEREIDE FERREIRA DA SILVA é Doutoranda em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande/ UFCG.

GESINALDO ATAÍDE CÂNDIDO é Doutor em. Engenharia de Produção. Professor do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande/UFCG.

ÂNGELA MARIA CAVALCANTI RAMALHO é Doutora em Recursos Naturais. Professora do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande/UFCG.


Resumo: O ensaio teórico em tela tem como objetivo analisar como a variável ambiental é elucidada no planejamento energético nacional, notadamente, no Plano Nacional de Energia planejado para o ano de 2030. A análise circunscrita a partir de uma revisão da literatura permitiu observar que o modelo de planejamento do setor elétrico brasileiro tem como parâmetro o modelo tradicional de planejamento que dá pouca ênfase às questões ambientais. O alcance de uma matriz energética nacional limpa depende de ações integradas envolvendo múltiplas abordagens, em destaque para o conceito de planejamento energético atrelado à incorporação de uma lógica sustentável, indicando parâmetros para a inclusão de várias fontes de energia, o que pode convergir para uma matriz sustentável em longo prazo.
Palavras-chave: Planejamento Energético. Variável Ambiental. Matriz Energética.

NATIONAL ENERGY PLANNING: A LOOK FOR ENVIRONMENTAL VARIABLE

Abstract: The theoretical essay on canvas aims to analyze how environmental variable is elucidated in national energy planning, notably at the National Energy Plan planned for the year 2030. The analysis circumscribed from a literature review allowed us to observe that the planning model of the Brazilian electricity sector has as parameter the traditional planning model that gives little emphasis to environmental issues. Notably, the scope of a national clean energy matrix depends on integrated actions involving multiple approaches titles for the concept of energy planning linked to the incorporation of sustainable logic, indicating parameters for the inclusion of various sources of energy, which can converge to a sustainable long-term matrix.
Keywords: Energy Planning. Environmental variable. Energy Matrix.

INTRODUÇÃO

Uma das questões mais deflagradas atualmente é a crise ambiental e energética que acontece em nosso planeta. A sociedade global, muito embora evidencie os sinais de desenvolvimento acelerado, continua a explorar de forma predatória os recursos naturais visando apenas o crescimento econômico.

Nesse sentido, em uma sociedade de risco global, em face das crescentes explorações dos recursos energéticos, é recorrente o debate acadêmico-científico sobre a problemática, o que tem contribuído, sobremaneira, para ampliação de estudos sobre a temática resultante, principalmente, das inquietações da sociedade sobre a questão ambiental. Adentrando nesse contexto, e tomando como base o cenário mundial de alterações climáticas, a questão energética coloca-se como um dos enfoques da discussão sobre a sustentabilidade, tendo em vista a importância da implementação de energias renováveis, além, evidentemente, das lacunas do planejamento energético nacional acerca das matrizes energéticas.

Atualmente, a ênfase do debate acadêmico sobre o enfoque energético tem sido pautada no meio ambiente e na diminuição dos recursos naturais, o que tem instigado tanto a ampliação de pesquisas sobre a temática, como também demandado das empresas e do poder público ações para a exequibilidade de novas formas de gestão e de planejamento energético, tanto para os sistemas de geração de energia quanto para os de transmissão e fornecimento. Isto porque a adoção de planejamento energético para a sustentabilidade que integre de forma sólida aspectos econômicos, sociais e ambientais tem sido cada vez mais recursiva, no âmbito governamental e também empresarial, o que evidencia a apreensão dos governantes e das corporações com o futuro e demanda a definição de objetivos a serem alcançados representando um investimento em longo prazo.

Diante desses argumentos, estudos que retratam o cenário atual e as perspectivas futuras envolvendo o tema planejamento energético no Brasil têm encontrado a provocação em lidar com a insegurança e a carência de informações sistematizadas. Sendo assim, enumeradas as importâncias relativas sobre a temática em foco, o estudo tem como objetivo analisar como a variável ambiental é elucidada no planejamento energético nacional, notadamente, no Plano Nacional de Energia planejado para o ano de 2030.

Planejamento Energético

Etimologicamente a palavra planejamento significa ato ou efeito de planejar, programar planos e ações. Pode-se, também, significar um conjunto de atitudes, procedimentos com o objetivo de realizar um determinado projeto. Assim, o ato de planejar significa fazer escolhas que subsidiam o ser humano no encaminhamento de suas ações e no alcance de resultados almejados, e, dessa forma, orienta um fim com um referencial futuro.

No campo econômico, notadamente após a Revolução Industrial, o ato de planejar ganhou espaço e, ao longo dos anos, o planejamento foi sendo progressivamente sistematizado e normatizado, adquirindo peculiaridades metodológicas advindas do intenso conhecimento de aplicação nas atividades humanas.

Ao analisar o propósito do planejamento, Faria (2000) afirma que é o alcance de objetivos e metas pré-estabelecidos, partindo-se do levantamento dos dados e informações notórias, que por sua vez irão definir os mecanismos de atuação por parte do planejador, tendo-se em vista a intensidade de recursos por ele disponíveis.

Ao adentrar na perspectiva global do planejamento no âmbito econômico, Cima (2006) contextualiza que a regra é assegurar a consistência entre a oferta e a demanda de bens em todos os setores. Prevê-se inicialmente um crescimento da demanda agregada por bens e serviços dentro das hipóteses do plano e, em seguida, dentro da lógica sequencial do planejamento econômico, a demanda é estimulada segundo o padrão de desenvolvimento escolhido e sua evolução é estimada, de forma que o próximo passo seja garantir que o crescimento da oferta ocorra de forma compatível e ao menor custo econômico (Idem, 2006).

No âmbito do planejamento energético tradicional, essa lógica é válida e acompanha a mesma coerência do planejamento econômico, dada a estreita relação entre o consumo de energia e o desenvolvimento econômico. Contudo, a flexibilidade dessa relação, em consequência da ruptura ocasionada pelos choques do petróleo, conduziu a um questionamento do mecanismo tradicional e deu passagem para um novo paradigma de análise dos padrões de utilização da energia.

Conseguinte a esse enfoque, percebe-se que até a crise do petróleo ocorrida na década de 1970, o ato de planejar no setor energético possuía muitas singularidades com o planejamento econômico então praticado: atender a demanda a um custo mínimo. A variável custo, no planejamento tradicional, limitava-se às circunscrições financeiras de oferta de energia, não sendo contemplado, até então, nenhum aspecto de ordem social ou ambiental relacionado com a implementação da alternativa de suprimento. Igualmente, a dinâmica de substituição dessas fontes não era ponderada, resultando em uma rigidez que servia de justificativa para a setorialização do planejamento (BAJAY, 2004, CIMA, 2006).

Sendo assim, a preocupação principal do planejamento energético consistia na otimização setorial do atendimento da demanda energética que, por sua vez, era valorizada a partir de projeções empíricas em face do crescimento econômico (CIMA, 2006). O que era preocupante se espelhava nos modelos de oferta de energia, voltada à melhor forma de atender a demanda ,principal preocupação dos tomadores de decisão. No entanto, sua aplicação se limitava a estudos setoriais e independentes, baseados em um planejamento não integrado, que muitas vezes levavam a conflitos de objetivos e subotimização intersetorial (CODONI; PARK; RAMANI, 1985; CIMA, 2006).

Contudo, três décadas após a grave crise do petróleo, o planejamento energético adotado pela administração federal demonstra que os preceitos da linha tradicional continuam sendo seguidos. O Plano Decenal de Expansão da Energia, produzido pelo Ministério de Minas e Energia, é um dos exemplos de planejamento direcionado por metodologias de desenvolvimento tradicional. O documento, que delineia as metas energéticas para o setor no período 2010-2019, prevê, em sua última versão, a expansão de termelétricas a combustíveis fósseis e o crescimento de em torno de 100% das emissões do setor elétrico nesse período.

O atual modelo de planejamento do setor elétrico no Brasil foi estabelecido em 2004 e possui como principal instrumento de expansão a oferta e a realização de leilões. O objetivo principal dos leilões é garantir que a oferta se amplie de forma a atender ao crescimento da demanda com o menor custo de geração possível, em linha com a precisão de garantir a modicidade tarifária, um dos pilares do marco regulatório do setor elétrico brasileiro.

Contudo, em um enfoque de longo prazo, o Planejamento Energético, na esfera federal, é fortemente criticado por organizações da sociedade civil e instituições acadêmicas, o que se observa em exemplos de cenários energéticos elaborados em parceria. O cenário – (r)evolução energética do Greenpeace – mostra que é possível manter, em um horizonte de longo prazo, a participação de 92% energias renováveis, na matriz elétrica congregada a minimização de 26% da projeção do consumo de eletricidade (BAITELO, 2011). O cenário prevê também a diversificação entre as fontes eólica, solar, biomassa e hidrelétricas (em pequenas centrais), aproveitadas em diferentes tecnologias. A geração elétrica a carvão, óleo diesel e nuclear é totalmente excluída da projeção para o ano de 2050.

Ressalve-se que a dialética da diversificação de fontes de energia é uma justificativa adequada por diferentes razões. Primeiramente, pela disponibilidade de fontes. O país tem potencial para ampliar fontes de energia não renováveis, como petróleo, gás natural, carvão, dentre outras. Mas também tem forte potencial para algumas energias renováveis, como eólica, solar, biomassa, hidrogênio e energia dos oceanos.

Num enfoque geopolítico, é importante que um país não dependa de uma ou de poucas fontes de energia. As desordens políticas em outros países podem acarretar sérios contratempos ao setor energético, o que pode resultar em um planejamento errado em decorrência de uma mudança no cenário internacional, o que não é incomum.

Plano Nacional de Energia 2030

O Plano Nacional de Energia 2030 (EPE, 2007) foi o primeiro planejamento de longo prazo de energia editado e publicado pela Empresa de Pesquisa Energética/EPE. Ao lado de outro documento, chamado de Matriz Energética Nacional 2030, o PNE 2030 é a principal ferramenta de planejamento de longo prazo à disposição dos gestores públicos e privados do setor. Órgãos como o Ministério de Minas e Energias (MME), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) utilizam o PNE 2030 diariamente.

O documento aborda diferentes cenários de evolução do setor energético e discute o setor elétrico em um capítulo específico, independente das fontes utilizadas.

Nessa abordagem, há uma retrospectiva do cenário energético nacional em comparação com o que se prospecta para 2030. Nesse sentido, o PNE 2030 (EPE, 2007) considera que a população brasileira no ano 2030 será maior em 55 milhões de pessoas, um contingente comparável à população atual do Nordeste brasileiro ou de países como a Espanha e a França. Uma renda maior e mais bem distribuída impulsionará o consumo de energia. A demanda de energia per capita evoluirá, como indicado no estudo da EPE, dos atuais 1,2 para 2,3 toneladas equivalentes de petróleo (tep). Ainda assim, será inferior ao consumo atual de países com a Bulgária, Grécia, Portugal ou África do Sul.

Santos e Souza (2011), ao sistematizar análise dos principais procedimentos e conteúdo do PNE 2030, identifica uma estrutura de planejamento forte em modelos econômicos, porém, fraca em modelos ecológicos, de forma que, sob o discurso da definição de uma estratégia de expansão da oferta de energia, na visão de desenvolvimento sustentável do país, o PNE 2030, de fato, não insere a variável ambiental no processo decisório (MME, 2012). Limita-se a fazer descrições genéricas de forma que não se pode verificar se determinadas informações foram ou não ponderadas na tomada de decisão.

No PNE 2030, também não se identificam procedimentos de orientação à tomada de decisão sobre a eliminação de alternativas de ampliação da oferta de energia por motivos ambientais. O PNE 2030 refere-se à participação popular de maneira tardia ao processo decisório, justificando as decisões depois de tomadas, sem permitir a participação no ato da construção do plano.

Conseguinte a essas elucidações, percebe-se que a abordagem da variável ambiental utilizada na visão do PNE 2030 não é contextualizada, considerando o dinâmico desenvolvimento das atividades do setor e a demanda pela proteção ambiental. O planejamento insere a variável ambiental como um fator de restrição ou impedimento para a expansão da oferta de energia, sendo indicados os condicionantes socioambientais para cada fonte/empreendimento energético.

À Guisa de Considerações

No atual Planejamento Energético Nacional adotado pelo Governo Federal, demonstra-se com clareza que continuam sendo seguidos os preceitos da linha tradicional. Com isso, o desafio presente dos planejadores e tomadores de decisão consiste na modificação de parâmetros de avaliação econômica e social, no remodelamento de sistemas de geração e consumo de energia e na incorporação da variável ambiental no processo de tomada de decisão.

Quanto ao modelo de planejamento do setor elétrico brasileiro a ser seguido e adotado na perspectiva de promoção do desenvolvimento que seja sustentável, este deve atentar para incorporação da variável ambiental, que deve ser contemplada na análise de quais os empreendimentos que devem ser inseridos na matriz elétrica brasileira.

Assim sendo, quando se pensar em planejamento energético nacional, o conceito mais adequado é o que considera a incorporação de alternativas energéticas, o que torna a questão do insumo energia bastante importante, ampla e complexa. Em virtude da solução, não se trata de uma ação isolada, mas de um conjunto de ações por parte de governos, empresas e da sociedade como um todo.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAITELO. Ricardo Lacerda. Modelo de cômputo e valoração e valoração completa de recursos energéticos para o planejamento integrado de recursos. São Paulo. Ed. ver., 2011. 400p.
BAJAY. National Energy Policy: Brasil. Encyclopedia of Energy, vol. 4. Elsevier, 2004.
CIMA. Fernando Monteiro. Utilização de indicadores energéticos no planejamento energético integrado [Rio de Janeiro] 2006. XIII, 195 p. 29, (COPPE/UFRJ, M.Sc., Planejamento Energético, 2006). Dissertação – Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE.
CODONI R.; PARK H.; RAMANI K. Integrated Energy Planning – A Manual. Asianand Pacific Development Centre. Kuala Lampur, 1985.
EPE – EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA. Plano Nacional de Energia 2030, Rio de Janeiro, 2007.
FARIA, J. C. Administração: Teoria e Aplicações. Rio de Janeiro: Thomson, 2000.
MME – Ministério de Minas e Energia. Plano Nacional de Eficiência Energética – Premissas e Diretrizes Básicas. MME, 2012.
SANTOS, Simone Mendonça; SOUZA, Marcelo Pereira de. Análise das contribuições potenciais da avaliação ambiental estratégica ao plano energético brasileiro. Eng. Sanit. Ambient. v. 16, n. 4. Rio de Janeiro, Oct./Dec., 2011.

 

Recebido em: 02/03/2014
Aceito em: 04/05/2014

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