ESPÓLIOS DA PSIQUE, DESTROÇOS DA FANTASIA: O EMBATE ENTRE OS MUNDOS EM O QUEBRA-NOZES E O REI DOS CAMUNDOGOS, DE E.T.A. HOFFMANN

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Matheus Pereira de Freitas
Hermano de França Rodrigues

Resumo

Resumo: Submergido na fantasia que lhe ramifica, o infans galga sua sobrevivência psíquica amparando-se nos objetos internos e externos que fortificam suas rudimentares raízes. Todavia, longe de proporcionar, unicamente, a proteção e a satisfação que a criança tanto almeja, a dinâmica objetal dos primeiros tempos subjaz sua lógica avassaladora sob o mesmo estandarte das mais destrutivas querelas da humanidade. Tal qual um mordaz campo de batalha, o corpo do bebê é invadido pela barbárie do mundo externo – desde os incompreensíveis cuidados maternais, até a bruta separação do desmame –, ao mesmo tempo, sua psique luta para controlar o irrefreável furor de seus soldados internalizados – suas próprias demandas pulsionais que ainda desconhece. Desse modo, nos espólios desta contenda primordial, entrevemos a conquista mister da subsistência humana: os alicerces inequívocos do crescer. Não obstante, investindo-nos sobre esse prisma ontológico do desenvolvimento psíquico, admitindo o corolário ofertado pela ciência psicanalítica, dardejamos o olhar para uma das produções mais singulares da estética literária infantil e juvenil, a inquietante narrativa do Quebra-nozes e o rei dos camundongos, escrita pelo romancista alemão E.T.A Hoffmann (1816). No romance, acompanhamos o testemunho imaturo da sentimental Marie, jovem que, após acolher o nobre Quebra-nozes no insuspeito regaço de seu quarto, acaba por presenciar os (dis)sabores de uma batalha mortal entre as forças diminutas de seus brinquedos, comandados por seu novo convidado, e uma vil infestação de camundongos, liderados pelo seu terrível rei de sete cabeças. Com efeito, nos trâmites desta disputa, que remontam a um amaldiçoado reino distante, vislumbramos os objetos bizarros que, mormente, suas estruturas macabras e terrificantes, subsídios da própria fantasística insólita de Hoffmann, dispõem a artilharia necessária para o fortalecimento do frágil ego em sua luta pela sobrevivência. Assim, investidos nos mecanismos de defesa matriciais do bebê, dispondo-nos da teoria magna de Melanie Klein (1945) e de seus seguidores, investigar-nos-emos as fantasias mais lúgubres do universo infantil, capazes, prontamente, de criar e de destruir, na mente, os mais suntuosos dos reinos.

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Como Citar
de Freitas, M. P., & Rodrigues, H. de F. (2022). ESPÓLIOS DA PSIQUE, DESTROÇOS DA FANTASIA: O EMBATE ENTRE OS MUNDOS EM O QUEBRA-NOZES E O REI DOS CAMUNDOGOS, DE E.T.A. HOFFMANN. Abusões, 18(18). https://doi.org/10.12957/abusoes.2022.65970
Seção
Bicentenário de morte de E. T. A. Hoffmann (1822 – 2022)
Biografia do Autor

Matheus Pereira de Freitas, Universidade Federal da Paraíba

Mestrando no Programa de Pós-Graduação de Letras da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Linha de Pesquisa: Poéticas da Subjetividade. Graduado em Letras – Língua Portuguesa pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Psicanalista Clínico em formação pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica (IBPC-SP).

Membro do grupo de pesquisa LIGEPSI (Literatura, Gênero e Psicanálise).

Hermano de França Rodrigues, Universidade Federal da Paraíba

Doutor em Letras – Português pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Especialista em Psicanálise: Teoria e Prática pelo Espaço Psicanalítico (EPSI). Professor Associado I, do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas (UFPB) e do Programa de Pós-Graduação em Letras (UFPB). Coordenador e criador do grupo de pesquisa LIGEPSI (Literatura, Gênero e Psicanálise).